The Project Gutenberg eBook of Os dialectos romanicos ou neo-latinos na África, Ásia e América This ebook is for the use of anyone anywhere in the United States and most other parts of the world at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this ebook or online at www.gutenberg.org. If you are not located in the United States, you will have to check the laws of the country where you are located before using this eBook. Title: Os dialectos romanicos ou neo-latinos na África, Ásia e América Author: Adolfo Coelho Release date: July 14, 2010 [eBook #33159] Most recently updated: January 6, 2021 Language: Portuguese Credits: Produced by Rita Farinha, José Carvalho and the Online Distributed Proofreading Team at https://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by National Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).) *** START OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK OS DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS NA ÁFRICA, ÁSIA E AMÉRICA *** Produced by Rita Farinha, José Carvalho and the Online Distributed Proofreading Team at https://www.pgdp.net (This file was produced from images generously made available by National Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).) *Nota de editor:* Devido à existência de erros tipográficos neste texto, foram tomadas várias decisões quanto à versão final. Em caso de dúvida, a grafia foi mantida de acordo com o original. No final deste livro encontrará a lista de erros corrigidos. Rita Farinha (Julho 2010) SOCIEDADE DE GEOGRAPHIA DE LISBOA OS DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS NA AFRICA, ASIA E AMERICA POR F. ADOLPHO COELHO Professor do Curso Superior de Lettras e socio effectivo da Sociedade de Geographia de Lisboa LISBOA CASA DA SOCIEDADE DE GEOGRAPHIA 89, RUA DO ALECRIM, 89 1881 IMPRENSA NACIONAL Extrahido do Boletim da Sociedade de Geographia de Lisboa OS DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS NA AFRICA, ASIA E AMERICA N'uma conferencia feita ante a Sociedade de Geographia em 16 de fevereiro de 1878 chamámos a attenção dos nossos consocios e do publico para as fórmas dialectaes particulares que algumas linguas europêas e particularmente o francez, o hespanhol e o portuguez, tinham tomado nas colonias e conquistas da Africa, Asia e America. Esses dialectos têem até hoje attrahido muito pouco a attenção dos linguistas, não existindo ainda nenhum trabalho geral sobre elles. Era nosso desejo reunir os materiaes para um trabalho especial sobre os dialectos portuguezes, e um trabalho geral comparativo em que tentassemos determinar as leis de formação d'esses dialectos, formação que se póde por assim dizer estudar _no vivo_, porque um similhante estudo não poderia deixar de nos ministrar dados importantes sob os pontos de vista glottologico, ethnologico e psychologico. Pedimos n'essa conferencia esclarecimentos, como já o tinhamos feito por outros meios, e os nossos pedidos não foram de todo inuteis. Um mancebo intelligente da ilha de Santo Antão, o sr. Cesar Augusto de Sá Nogueira, que assistíra á conferencia, deu-nos todos os materiaes para o estudo que publicâmos do dialecto creolo d'aquella ilha. O nosso amigo rev. R. H. Moreton continuou nos seus dedicados esforços para nos obter publicações no dialecto portuguez de Ceylão, e a elle devemos em grande parte poder dar hoje uma bibliographia já assás consideravel d'essas publicações e, o que é mais, possuil-as, estando assim habilitados para publicar em breve um estudo bastante completo sobre a _Grammatica e vocabulario do indo-portuguez_. No meio de outros trabalhos mais consideraveis nunca perdemos de vista os dialectos creolos, que havia muito nos interessavam, e fomos assim reunindo uma serie de noticias, em parte simplesmente bibliographicas, cujo conjuncto nos parece offerecer já doutrina sufficiente para constituir materia de um artigo de ensaio. Por mais incompleto que fique o nosso trabalho estamos certos que vem preencher uma lacuna no quadro da glottologia. Fr. Pott no quadro systematico-bibliographico da glottologia que serve de prefacio ao tomo II, 4 das suas _Etymologische Forschungen_ (1870) nem sequer menciona os dialetos creolos; nos livros geraes de Whitney, Max Müller e outros sobre a glottologia em vão se busca uma noticia d'esses tão interessantes productos; as opiniões expressas por alguns linguistas sobre o caracter d'esses dialectos, são, como veremos, indecisas ou erroneas, ou não apontam os lados por que esses dialectos são mais importantes para o observador. Comprehende-se este facto singular da historia da nossa sciencia quando se sabe que uma parte dos glottologos gastam o seu tempo á busca da solução de problemas ou insoluveis ou cuja chave não está ainda descoberta (etrusco, basco, acadiano, etc.), e outra anda absorvida pelos seus estudos especiaes, sem duvida interessantes e muitas vezes importantes, mas que fazem desviar a attenção de questões de muito maior momento, sendo poucos os que fazem progredir a sciencia de uma maneira sensivel. O nosso ensaio seria muito mais completo se tivessemos maior numero de informações dos dialectos das nossas colonias e conquistas, e se tivessemos visto diversas publicações sobre os dialectos similhantes das outras linguas europêas, que por diversas causas não podémos examinar. Entre essas causas predominam a raridade de algumas d'essas publicações e miseravel dotação das nossas bibliothecas, que não lhes permitte comprar senão poucos livros que interessem a um pequeno numero de estudiosos. I. DIALECTOS PORTUGUEZES 1. Creolo da ilha de Santo Antão (archipelago de Cabo Verde) Este dialecto é fallado principalmente pela população de côr e pelas creanças que o aprendem com as creadas e amas negras. Distinguem-se duas fórmas: o creolo _rachado_, creolo _fundo_, creolo _vejo_, fallado principalmente no interior da ilha e de que as noticias e documentos que publicâmos dão conhecimento, e o creolo em que a grammatica portugueza é menos ignorada, distinguindo-se quasi unicamente pela pronuncia de algumas palavras ou sons e pelo accento geral. As cartas seguintes foram escriptas por pessoas instruidas que fallam bem o portuguez, mas conhecem bem o creolo rachado. O unico documento verdadeiramente genuino do dialecto de Santo Antão acha-se na serie de adivinhações que o nosso amigo o sr. Sá Nogueira nos ministrou. Carta 1.^a Nha amigo.--Cu préssa en scrêbê | Meu amigo.--Com pressa escrevi ês dôs fója di papel, qui dentro | estas duas folhas de papel que dentro d'ês carta en tâ manda nhô. | d'esta carta lhe envio. | Talvêz algun cúsa, palabra, ou | Talvez alguma cousa, palavra ou móde nhù crê, stâ êrrado. Cuza | como quizer, esteja errada. O que qn'en câ tâ dubída; pamóde pâ | não duvido, porque por mais creolo más criôlo qui nós di Cabo Berde | que nós de Cabo Verde saibâmos, nú sabê, sénpre nu tâ ncontra | sempre encontrâmos difficuldade ou dificuldade ou enbaráço, quel'ora | embaraço logo que pegâmos na | qui nú pêga na péna pâ nu scrêbê na | penna para escrevermos na nossa nós lingua. | lingua. | Ês culpa ê câ di nós, ê di gobérno, | A culpa não é nossa, é do governo qui si al bê animaba nós na | que longe de animar-nos em qualquer calquér cuza, ê tâ oprimíno cú má | cousa, opprime-nos com a má scoja di sês empregado, qu'ê tâ | escolha dos seus empregados, que manda pâ Cabo Berde. | elle manda para Cabo Verde. | Ê tâ fazê bên mal, pamóde assi | Faz bem mal, porque assim perde ê tâ pêrdê tudo amor, tudo stima | todo o amor e toda a estima que qu'ê pôdê tên na pôbo di Cabo | póde ter no povo de Cabo Verde. Berde. Ês cuza ê câ só na Cabo | Isto não é só em Cabo Verde é por Berde, ê pâ tudo cábo, unde ê tên | toda a parte, onde elle tem um palmo un palmo di chôn. En podê flába | de terra. Eu podia dizer-lhe nhô cuzás chéo a ruspêto di nós | muitas cousas a respeito do nosso gobérno na Cabo Berde, ¿mas paquê? | governo em Cabo Verde, mas para Ês carta ê câ, sima português | que? Esta carta não é, como dizem tâ flâ, di politica, e pamóde | os portuguezes, de politica, e por ês en tâ bira pâ principio di nós | isso volto ao principio da nossa conbersa. Ê sima en staba tâ flâ | conversação. É como lhe estava dizendo, nhô, en câ sabê si algun cuza stâ | não sei se alguma cousa está tórto ou mál screbêdo nês dôs fójas | errada ou mal escripta n'essas duas di papel; mas câ m'inporta cú | folhas de papel; mas não nos importemos ês, e nhu ôubi cuss'ê qu'ent â flâ | com isso, e ouça o que nhô: Na fója un e na linha binte | lhe digo: Na folha 1 v. e linhas eu binte un, nhu tâ lé na banda | vinte e vinte um, na columna creola di criôlo «nha Dóna di nha Lucía» | «nha Dona nha Luzia», e no portuguez e na banda di português nhú câ tâ | não encontro nada que, acha nada qui, sima português tâ | como dizem os portuguezes, lhe flâ, tâ corrêspondêl. | corresponda. | Nhú sabê ê pamóde? Ê pamóde | Sabe a rasão? É porque Dona ês _Dóna_ ê un nóme qui na criôlo | n'aquelle logar é um nome que em tâ chomádo «nome di cassa», e ê | creolo se chama «nome de casa», tâ custuma pôdo n'algun minino | e usa-se nas meninas (creanças). fémea. Ê pâ ês nóme que ês minino | É por esse nome que ellas são chamadas tâ chomado tioqu'ê grande, | até á maioridade ou até á ou tioqu'ê mórré. Ês uso ê câ só di | morte. Este uso não é só de Cabo Cabo Berde, na Brazil tanbê ê tâ | Verde, no Brazil tambem se usa, usado, e assi mi conchê ghentes | e assim conhecemos muita gente chéo cú nome di Nené, Nhanhina, | com os nomes de Néné .......... Nhánha, Sinhârínha, Nhásinhára, | ............................... Júca, Jóca, sin sér sês nome di | ...... e Joca sem serem os seus batismo, ou _sês nome di greja_. | nomes de baptismo. | Agora si nhú crê sabê cuss'ê quí | Agora se quizer saber o que quer Dóna crê flâ, en tâ flâ nhô, no | dizer Dona, eu lhe digo, em portuguez portugués ê _avó_ e Dóno ê _avô_. | é avó e Dono avô. | A ruspêto di berbo, criôlo câ tên | Emquanto a verbos, o creolo não tudo qui português tâ choma _ténpo_.| tem tudo quanto o portuguez chama tempo. | Prónóme ê sima ja'n esplicá nhô | O pronome é como já lhe expliquei na fója dôs. Na criôlo di Cabo Berde| na folha 2. No creolo de Cabo câ tên _bós_ ou _abós_ pâ _vós_ di | Verde só ha _bós_ ou _abós_ para o _vós_ português, e ês tâ flâ _nhô_, o | portuguez, e usam de _nhô_ quando qu'ês tâ papiâ cú alguên só, e | fallam a uma pessoa só, e de _nhôs_ _nhôs_, o qu'ês tâ papiâ cú más | quando fallam a mais de uma. d'un. | | Agora _En_, _min_, _amin_ ê quasi | Agora emquanto a _Eu_, _min_, _amin_ tudo ô mésmo, cú algun différença, | é quasi tudo o mesmo, com alguma cónfórme conbersa tâ corrê. Tanbê | differença conforme o seguimento criôlo tên _mi_. Ex.: | da conversação. Tambem o creolo | tem _mi_. Ex.: | En crê ês cuza. | Eu quero esta cousa. | Quênhê qui fazê ês cuza? Ê mi. | Quem fez isto? Fui eu. | Amin en sâ tâ bá enghênho, ou | Eu vou ao engenho.......... Amin sâ tâ bá enghênho, ou En | ............................ sâ tâ bá enghenho. | | Jâ bástâ. Nhú al stâ enfadado. | Basta. Deve de estar enfadado. Agóra tioque nu encontra na | Agora até quando nos encontrarmos biblióthéca. | na bibliotheca. | Nhú acreditan, cum'amigo (_ou_ | Acredite-me, como amigo, que sima'amigo) qui tâ respêta nhô chéo.| muito o respeita. Carta 2.^a _Césa._--Pan fartá-bo bontade en | Cesar.--Para vos fazer a vontade tâ scrêbê-bo na nós lingua, na | eu escrevo-vos na nossa lingua, criôlo rachado, qu'en câ sabê si bô | em creolo fundo, que eu não sei tâ entendê-le. | se vós o entendeis. | Flan: pâ que bô mestê pâ nû | Dizei-me: para que precisaes de scrêbêbo nês lingua? Bô tenê gána | que vos escrevamos n'esta lingua? di estudâ si orige, fazê algun | Tendes desejo de estudar a sua gramatica ou dicionare? S'ê pâ algun| origem, de fazer alguma grammatica dês cussa Deus juda-bos; mas dexam | ou diccionario? Se é para alguma fla-bo mê al fazê-bo suâ tioque | d'estas cousas, Deus vos ajude, bu câ podê más, tioque bi seinti... | mas sempre vos direi que isso | vos fará suar até não poderdes mais, | até que o sintaes.............. | N'ês ija quasi tudo alguên tenê | N'esta ilha quasi toda a gente médo di Duco. Duco bu conchê-le? | tem medo de Duco: Duco vós conheceil-o? Estan mâ náu. Duco era un préso | Estou que não. Duco era que staba na calabôs; ê entendê mê | um preso que estava no calabouço; câ stába lâ sábe, ê fugi êle cû dôs | e entendeu que não estava lá bem; companheros; ê stâ riba cháda; tâ | e fugiu com dois companheiros; está mátâ cábra, tâ forçâ mujéres, tâ | em cima da achada; mata cabras, fazê tudo casta di pouca borgonha. | força mulheres, faz toda a casta Flado mâ Duco manda flâ Henrique | de pouca vergonha. Diz-se (fallado) d'Olibéra, Puchim, Maia, Bencesláu | que Duco manda dizer a Henrique pâ ês tomâ seintido cú sês | de Oliveira, Puchim, Maia, Wenceslau bida, pâ ês câ bá fóra, pamóde se | para que estes tomem sentido encontra cu êles mê tâ matalos. | com a sua vida, para estes não Fazê idéa mó ês al tênê mêdo! | irem fóra, poisque se se encontra | com elles que os mata. Fazei idéa, | como estes terão medo! | P. si bida ê dentro cartore; ê | Paulo a sua vida é dentro do stâ magro sima alguên tisgo; ê flâ | cartorio, elle está magro assim como mâ só bo que sâ tâ fazê-le falta; | um tisico; diz que sois vós que ê mandá-bo mantenha chéo. | lhe tendes feito falta; elle manda-vos | muitas recommendações. | Ti outr'ora; en câ ten mâs tempo. | Até outra occasião; eu não tenho Bo armun, etc. | mais tempo. Vosso irmão, etc. Carta 3.^a Nha estimado armun. En rêcêbê | Meu estimado irmão. Eu recebi carta di nhô, qu'in fica munto | carta do senhor, que eu fico muito contente con êl, e pan fazê nhô | contente com ella, e para fazer ao bontade en tâ cumçâ screbê nhô na | senhor vontade eu começo a escrever criôlo. Primêro nobidade qu'in tâ | ao senhor em creolo. Primeira dâ nhô ê cumâ C. mâ tâ recitâ quês | novidade que eu dou ao senhor é berços di dôda de Albano na criôlo | que C. recita aquelles versos da doida e ê ta cunçal sin: | de Albano em creolo, e começa | assim: | Benca li nha fijo sucuta: | Vem cá meu filho escuta: | Bê ê amigo di bu mái? | És amigo de tua mãe? | Bé! nha mái, e que pergunta ê | Bem, minha mãe, e que pergunta ês? | é essa? | Pôs bên, sima bu ojá ês carnuja | Pois bem, assim como tu vês este carnugado, ferucho feruchado ê | ferro enferrujado é sangue de teu sangue di bu pai; i bu tâ juran cumâ| pae, e tu juras-me como o vingas? bu ta bingal? | | En tâ jura! | Eu juro! | Ampôz ê Ricardo pai di Maria, | Pois é Ricardo, pae de Maria, qui matâ bu pai! | que matou teu pae! | Bé! mamái! Pai di Maria en câ | Bé! mamã! Pae de Maria eu não podê matal, pamóde Maria stan | posso matal-o, porque Maria está dente nha côraçon. | dentro de meu coração. | E assim cú munto cuza, mas | E assim com muita cousa, mas qu'in câ sabê, e por isso en câ tâ | que eu não sei, e por isso eu não pon. Quen qui costumá tanbê recital | ponho. Quem aqui tambem costuma ê Brito e mas Quinquim. | recital-os é Brito e mais Joaquim. | En pidi nhô di fabôr pá nhú mandan | Eu pedi ao senhor o favor de quêl dicionare; en pedi té na | mandar-me aquelle diccionario; eu português, gora en tâ biral na | pedi em portuguez, agora eu traduzo criôlo. Quê pâ fabur câ nhú | (viro) em creolo. Queira por desquecê. En tâ, cába ês carta pan | favor não se esquecer. Eu acabo porgunta nhô s'ê pêrciso escrêbê nhô| esta carta por perguntar ao senhor en criôlo na tudo bapor, ou náo. | se é preciso escrever ao senhor em | creolo por todos os vapores ou não. | Nhu adés, nhú dán tudo alguen | mantênha chéo. Tudo ghentes di | casa tâ mandâ nhô mantenha chéo. | Phrases diversas Mâ nhu stâ? ou Mâ nhu pássâ? | Como está? ou como passa? | Cômmôdádo, nhô mâ nhu sa ta | Bom, e o sr. como tem passado? pássâ? | | Mâ ba ghentes tudo dinhô? _ou_ | Como estão todos os seus? Móde ghentes tudo di nhô stâ? | | Tudo stâ bon, graças a Déus. | Todos estão bons, graças a Deus. | Jâ dura qui en ca ôjâ nhô; Unde | Ha muito tempo que o não vejo, nhu staba? _ou_ Unde nhu tên stado? | onde tem estado? | Mi en stába la na Orgôn, _ou_ En | Eu estava nos Orgãos, ou eu tenho tên stâdo la na Orgôn. | estado nos Orgãos. | Cuz'é _ou_ Cuss'ê nhu bá fazêba lâ? | O que foi lá fazer? | En bába oja (_ou_ en bá ojába) un | Fui ver uma parenta minha que nhâ parente, qui stába doente. | estava doente. | ¿Quênhê, tia di nhô, nhâ Maria? | Quem? a sua tia, a sr.^a Maria? ¿Cuss'ê qu'ê tênba? | O que tinha ella? | E tênba dór na péto, _ou_, ê ta | Tinha dores no peito, ou queixava-se quexaba di dór na péto. | de dores no peito. | Ê jâ stâ milhor? | Já está melhor? | En dêxal um pouco milhor, _ou_, | Deixei-a um pouco melhor. En dêxal más cômôdádo un pouco. | | Púndo nhu sâ tâ bai? (_gossi-n_). | Para onde vae agora? | En sâ tâ bai Praia. | Vou á Praia. | I mi en sâ tâ bai (_ou_ bá) Tarrafal| E eu vou para o Tarrafal. _ou_ Tarfal. | | Anton nhu tên qui anda chêo | Então tem de andar ainda muito. inda. | | Qui horas ê gossin? _ou_ Canto | Quantas horas são? hora jâ dâ? | | Já stâ pâ dôs hora. | Devem ser duas horas. | Dêxam bai, tioque nu torna ojá. | Deixe-me ir, até quando nos tornarmos | a ver. | Nhu adés. (_adés_). | Adeus. | F. En tâ pidi bo pâ bo escrêbên | F. Peço-te que me escrevas uma um carta na criôlo, mas num criôlo | carta em creolo, mas em um creolo bêrdadêro. | verdadeiro (puro). Has de achar Bu al acha galante ês pidido; | exquisito (extravagante) este pedido, mas oc bu sabê ê pâ cuzé, bu al | mas quando souberes para que ficá conténte. Gossin en câ podê | é, ficarás satisfeito. Agora (n'esta flábo ê pâ que fin, pamóde en câ | occasião) não posso dizer-te para tên ténpo. | que fim é, porque não tenho tempo. | Câ bu squêcê, ¿já bu oubí? | Não te esqueças, ouviste? | Bo armun amigo. | Teu irmão, amigo. | Jâ bu râcêbê nha carta qui en | Já recebeste a minha carta que scrêbê-bo na criôlo? Respondên e | te escrevi em crioulo? Responde-me e mandâ flan mode ghentes tudo | e manda dizer-me como estão todos. stâ. | | Titia jâ stâ mijór di si dismaios? | A tia já está melhor dos seus Nha Dóna di nha Lucía inda câ | desmaios? A nha Dona da Luzia cômôda? | ainda não está boa? | Logo qui[1] bu rêcêbê ês carta, | Logo que receberes esta carta bu ta manda chôma Roque, e bu | mandarás chamar o Roque, e lhe ta flal cumâ en rêcêbê si carta, e | dirás que recebi a carta d'elle, e su xinti chêo di más, di máo tratos,| senti bastante dos maus tratos, que qui scribons sâ tâ dal. | os escrivães lhe têem dado. | Comâ gossin en câ podê fazel | Que agora nada lhe posso fazer, náda, e pâ ê spêra tioque en boltâ | e que espere até (quando) eu voltar C. Berde; e anton en tâ oja, si | a Cabo Verde, e verei então se algun cuza en tâ podê alcança na si | alguma cousa posso alcançar em fabôr. | seu favor. Adivinhações «Os creolos em Cabo Verde, diz-nos o sr. Nogueira, pelo menos em Sant'Iago, têem por costume contarem historias, isto é, lendas ou contos. «Quasi sempre essas historias são contadas á noite, assentando-se as pessoas que tomam parte n'esse passatempo de caracter verdadeiramente familiar, á porta da rua ou então dentro de casa, fazendo d'esse passatempo um serão. Precedem a essas historias as adivinhações, sendo algumas d'estas bem obscenas.» Eis uma pequena serie d'essas adivinhas que o nosso collaborador nos ministrou: 1. Xintido. | Mi li, mi lá. | 2. Porco. | Mungo mungo tâ ba rúbera. | 3. Chúba na banána. | Ráque-ráque na pedragál. | 4. Ê un home que mátâ un buro, { Curupíu de dâs pé mátâ curúpíu de pamóde um pé de coube. { quato pé, sob curupiu de um pé. | 5. Ê ôjo. { In tên nhâ dôs fijo na janélla nium { câ tâ ôjâ companhêro. | 6. Falla. { In tên nhâ fijo in tâ mandal dento { chuba ê câ tâ môjâ. | 7. Máma di cadêra. { In tên nhâ dôs fijo tâ córê tudo córê, { nium câ tâ pássâ companhêro. | 8. Oréja. { In tên nhâ figuêrinha na pónta di { rócha, tâ queí, câ tâ queí. | 9. Sónbra. { In córê ín câ pêga, in xinta in { pêga. | 10. Bôca cú dente. | In tên nhâ pucarínha cheio d'ôsso. | 11. Tripiche. { Chôro na cassa di riba, batuque na { cassa di baxo. | 12. Pánno. | Nôte di cumprido, di dia di trabêsado. | 13. Caldêron. { Ê tên pé ê câ tâ ánda ê tên aça ê { câ tâ buâ. | 14. Arco d'abêja. { Jôn di Pico, Manél d'Orgôn, sê câ { súbi ê al trabêssa. | 15. Pedra fôgôn. { In tên três préto; si ún câ stâ, quêlouto { dôs câ tâ sirbi. | 16. Óbo. { Radondête indête _que não tem_ tapo { nem tôpête. | 17. Anzol:--ê tâ lêba isca mórto, { Préto côrcôbádo que tâ lêba mórto, ê tâ tarcê pexe { tâ trâzê bibo. | 18. Póte. | Ê bá dêtado, ê bên sâquédo. | 19. Estréla na Céo. { In tên nha cúrál di cábra, nôte pâ { manheê nium. | 20. Máma de báca. { Nha quato bôli bóca pâ báxo lête { câ tâ lánça. | 21. Estrubado. { Nhâ boi tâ bônba lâ na Tarafál, in { tâ oubi li. | 22. Mandioca. { Ríquití pé béjo fésta quê câ chiga, { ê câ sabe. | 23. Morte | In bai pân cá bên más. | 24. Calbicêra. { Albo cú mâ albâiáda, verde mâ { vêrdête, tên côr di rabu de sancho, { mas ê câ êl. | 25. Caminho. { Un hóme grande sin sónbra. | 26. Fumo. { Nha cabállo dento cóma na rua. | 27. Sino. { Sin câ pêga nha boi rábo ê câ tâ { bônba. | 28. E côco cú si pája, cu cumida, { In tên un caza di pája dento quêl cu ágo. { caza di pája in tên un caza branca, { dento caza branca in tên un { fonte d'ágo. | 29. Cruz na cháda. { In tên nha báca na cháda, in câ { tâ dâ pája, in câ tâ dé ágo, tudo { alghên qui páçâ ta botan el um { mô de pája. | 30. Nabíu. { In tên un óme grande na mê di { mar, s'ê câ bento ê câ tâ anda. Observações phoneticas Dos sons do portuguez faltam no creolo de Santo Antão _lh_, substituido por _j_ (_paja_, _ija_, _foja_, _fijo_, _scoja_), _v_ substituido por _b_ (_dubida_, _dêbê_, _oubi_, _pobo_, _conbersa_, _biro_, _fabur_); os diphthongos nasaes (_Jan_==_João_, _Orgon_==_Orgãos_, _coraçon_==_coração_, _armun_==_irmãos_, _náo_==_não_); o diphthongo _ei_, substituido por _é_, _ê_ (_proméro_, _ruspêto_, _figuêrinha_). Ha alguma tendencia para o iotacismo: _di_==_de_. _I_ desapparece em _pos_==_pois_, _mas_==_mais_. Mudanças varias nas vogaes atonas: _armum_==_irmão_, _proméro_==_primeiro_, _borgonha_==_vergonha_, _ruspêto_==_respeito_. Mudança nas vogaes accentuadas: _cuza_==_cosa_, _favur_==_favor_. Apherese de vogal ou de syllaba: _sim_==_assim_, _nhô_==_senhor_, _nha_==_minha_[2]; _tâ_==_está_. Syncope de vogal: _cumçâ_==_começar_, _crê_==_querer_, _conchê_==_conhecer_. Apocope de vogal ou de syllaba inteira: _calabôs_==_calaboço_, _mó_ (como)==_modo_, _mo_==_molho_, _ês_==_este_. Apocope de _r_: regular no infinito (_ser_ é uma excepção, se não ha erro no paradigma que nos enviou o nosso informador); _nhô_==_senhor_, _pâ_==_por_. Varia: _ago_==_agua_, _sucuta_==_escuta_. Observações morphologicas 1. _Genero._ Os adjectivos não têem fórmas que indiquem o genero. A fórma typica é em geral a fórma masculina portugueza; mas ha excepção, como _nha_==_minha_. 2. _Numero._ O emprego das fórmas do plural não se póde estabelecer com certeza dos textos que temos á nossa disposição, nem das noticias que nos ministraram. Os casos seguintes parecem-nos representar as tendencias do dialecto no emprego do _s_ do plural: a) os adjectivos e pronomes empregados como adjectivos não tomam o signal do plural (mas diz-se _quel_, _quels_); b) com os numeraes o substantivo não toma o signal do plural (mas na carta 2.^a ha _dôs companheros_); c) quando do contexto da phrase resulta a idéa da pluralidade falta o _s_ do plural. Exemplos: _es dos foja._ estas duas folhas. _tres preto._ tres pretos. _mujer, mujeres._ mulher, mulheres. Com relação ao plural diz-nos o nosso informador: «A tendencia que ha hoje para empregar regularmente as fórmas do plural torna-se muito sensivel». 3. _Pronomes._ Os pronomes demonstrativos são: _ês_ (este, esse) e _quel_ (aquelle). _Ês home._ Este homem. _Ês mujer._ Esta mulher. _Ês homes._ Estes homens. _Ês mujeres._ Estas mulheres. _Quel rapaz._ Aquelle rapaz. _Quel rapariga._ Aquella rapariga. _Quels_ (ou _quel_) _rapaz_. Aquelles rapazes. _Quels_ (ou _quel_) _raparigas_. Aquellas raparigas. O interrogativo é: _quen_, _qui_, ou _quê-nhê_, quem. Eis o quadro dos pronomes pessoaes. Singular: _En_, _in_, _mi_ eu _-n_ -me _Bu_ (abó) tu _Di bó_ de ti _-bo_ -te _Ê_ elle _-l_ lhe _nhô_ lhe (vos) _êl_, _-le_ o Plural: _Nós_, _nu_ nós _-no_ -nos _Nhô_, _nhôs_ vós _nhô_ vos _Ês_ elles _-ls_ lhes _Quên qui dan (dâ-n) el._ Quem m'a deu. _Quên qui dá-bo el._ Quem t'a deu. _Quên qui dá-nhô el._ Quem lh'a deu. _Quên qui dá-no el._ Quem nol'a deu. _Quên qui dá nhô el._ Quem vol'a deu. _Quên qui dals (da-ls) el._ Quem lh'a deu. _Bu tâ entendêle._ Tu entendel-o. _En tâ jural._ Eu o juro. _Bu_ (vós) tendo usurpado o logar de _tu_, não ha pronome da segunda pessoa do plural; o _pronomen reverentiae_ é substituido por _nhô_==senhor, _nhâ_==senhora. _Nhô_ tomou o signal do plural: _ô nh'amigos, nhôs al judan fazê ês cuza_, ó meus amigos, vós haveis de me ajudar a fazer esta cousa. O pronome da segunda pessoa do singular diz-se _bó_ quando é precedido de proposição: _di bó_, de ti. Nas ilhas de Barlavento ha _bucê_, _bucês_, _bocê_, _bocês_ em logar de _bó_, _abó_ e _nhô_. Os seguintes exemplos mostram as fórmas dos possessivos ou seus equivalentes: _Nha caballo._ O meu cavallo. _Nha caballos._ Os meus cavallos. _Nha egua._ A minha egua. _Nha eguas._ As minhas eguas. _Ês caballo ê di men._ Este cavallo é meu. _Ês caballos ê di men._ Estes cavallos são meus. _Ês egua ê di men._ Esta egua é minha. _Ês eguas é di men._ Estas eguas são minhas. _Bu cavallo._ O teu cavallo. _Bu cavallos._ Os teus cavallos. _Bu egua._ A tua egua. _Bu eguas._ As tuas eguas. _Ês caballo ê di bó._ Este cavallo é teu. _Ês egua ê di bó._ Esta egua é tua. _Si caballo, sês caballo._ O seu cavallo, o cavallo d'elle. _Caballo di nhô_ ou _nhâ._ O seu (vosso) cavallo. _Ês caballo ê di nhô._ Este cavallo é vosso, seu. _Nós boi._ O nosso boi. _Nós báca._ A nossa vaca. _Ês boi ou ês báca ê di nós._ Este boi ou esta vaca é vosso, vossa. _Si caballo, sês caballo._ O seu cavallo (d'elles). _Ês caballo ê di sês, d'êls_ ou _d'ês._ Este cavallo é seu (d'elles). 4. _Verbo._ Esta parte da grammatica do creolo de Santo Antão apresenta uma riqueza muito maior que em geral os outros dialectos similhantes. Não é difficil explicar este facto: o contacto persistente entre a população que falla o dialecto e os que fallam o portuguez puro tende naturalmente a fazer penetrar no creolo maior numero de fórmas portuguezas. Vimos já o que se dava com as fórmas do plural. Damos os paradigmas da conjugação e faremos depois algumas observações sobre elles. Ser (sér) Indicativo Presente _Mi ê_ Eu sou _Bu, abo_ ou _abo bu ê_ Tu és _Êl ê_ Elle é _Nós, nos nu ê_ Nós somos _Ês ê_ Elles são Perfeito composto _Eu ten sido_ Eu tenho sido _Bu ten sido_ Tu tens sido _Êl, ê ten sido_ Elle tem sido _Nos, nu, ten sido_ Nós temos sido _Ês tên sido_ Elles têem sido Imperfeito e perfeito _Mi era_ Eu era _Bu etc. era_ Tu eras _Êl era_ Elle era _Nós era_ Nós eramos _Ês era_ Elles eram Futuro _En al ser_ Eu serei _Bu al ser_ Tu serás _Êl al ser_ Elle será _Nu al ser_ Nós seremos _Ês al ser_ Elles serão Condicional _En tâ sérba_ Eu seria _Bu tâ serba_ Tu serias _Ê tâ sérba_ Elle seria _Nu tâ sérba_ Nós seriamos _Ês tên de ser_ Elles seriam Subjunctivo Presente _En ser_ Eu seja _Bu ser_ Tu sejas _Ê ser_ Elle seja _Nu ser_ Nós sejamos _Ês ser_ Elles sejam Imperfeito _Mi era_ Eu fosse _Bu era_ Tu fosses _Êl, ê era_ Elle fosse _Nu era_ Nós fossemos _Ês era_ Elles fossem Futuro composto _In ten de ser_ Eu tiver de ser _Bu ten de ser_ Tu tiveres de ser _El, ê ten de ser_ Elle tiver de ser _Nos, nu ten de ser_ Nós tivermos de ser _Ês ten de ser._ Elles tiverem de ser Imperativo _Ser_ Sê tu _Nhu ser_ Sede vós Haver Este verbo é quasi exclusivamente empregado para a expressão do futuro como auxiliar, portanto no presente do indicativo. A fórma _al_ provém de _ha-de_, por apocope e mudança de _d_ em _l_. O verbo _dêbê_ é empregado como auxiliar, substituindo _al_. Na cidade da Praia diz-se _hôbe (oubi) tempo, tên habido_, mas essas fórmas não se acham ainda no creolo rachado. Ten (ter) No presente do indicativo _tên_ para todas as pessoas no paradigma escripto pelo nosso informador; mas nas cartas 2.^a e 3.^a ha _tênê_ como fórma fundamental, servindo pois para o presente só com os pronomes e figurando nos tempos compostos, como _ser_ no paradigma acima. O imperfeito e o perfeito do indicativo tem _tenba_, tinha, para todas as pessoas; o imperativo _tên_. Emprega-se o participio _tido_. Stá (estar) No presente do indicativo _sta_ ou _star_ para todas as pessoas; no imperfeito _staba_, no perfeito _stêbe_, ou no creolo rachado _staba_, como no imperfeito. Os tempos periphrasticos conformam-se ao paradigma de _ser_. Emprega-se o participio _stado_. Verbos não auxiliares O presente em regra é expresso por _tâ_ (-stá) com o infinito, para todas as pessoas exemplos: _en tâ jurâ_, eu juro, _bô tâ flâ_, vós dizeis; mas occorre tambem como presente a simples fórma do infinito: _nhu sabê_, vós sabeis. Algumas fórmas do presente portuguez, principalmente da terceira pessoa, occorrem, sem variação, com o auxiliar _tâ_ ou isoladas, exprimindo o presente: _en tâ bai_, eu vou; _êl tâ lêba_, elle leva; _en péga_, eu agarro; _en tâ biro_, eu volto; _in xinto_, eu me sento. Ha fórmas do preterito como _fazeba_, fazia, _baba_, ia (sobre o presente _bai_). O perfeito parece ser expresso pelo infinito, como _recebê_, _fugî_ (elle fugiu), _xinti_, _matá_, _entendê_, nas cartas acima. O imperativo é expresso pelo infinito: _esquecê_, esquece, esquecei; _judá_, ajuda, ajudae. Occorrem algumas fórmas particulares como _ben_, vem, vinde. Ha participios em _ado_ como _usado_, _enfadado_, em _edo_ como _screbedo_, escripto, em _ido_ (normal?). Os tempos periphrasticos seguem o paradigma de _ser_ (auxiliar com a fórma principal, infinito presente ou participio passado). Algumas vezes o futuro é identico ao presente: _en tâ mandá_, mandarei; _bô tâ flal_, dir-lhe-has. Observações lexiologicas A etymologia dos vocabulos creolos é geralmente transparente nos specimens que publicâmos; notâmos apenas particularmente os seguintes, comquanto outros chamem tambem a attenção: _Câ_, não; origem incerta. _Mâ_, _mê_, que; provirá da conjugação adversativa _mas_? _Mantenha_ em _mantenha chéo_, significando muitas recommendações; originou-se este emprego evidentemente da formula antiga de saudar: _Deus te mantenha_. _Pamóde_, porque; provém da formula _por amor de_, _por mór de_, muito usada em portuguez, significando por causa de. No dialecto de Macau usa-se no mesmo sentido a variante phonetica _prómódi_. _Papiá_, fallar; _flâ_ toma o sentido de dizer. _Sâ_ em _nhu sâ tâ passado_ como tem passado, e _sâ tâ dal_, lhe tem dado, etc., é obscuro para nós. _Sábe_ (de _saber_) serve para exprimir que uma cousa é agradavel; _câ sábe_, que é desagradavel; _ês cumida ê sâbe_, esta comida é agradavel, sabe bem; _quel home tên ar sábe_, aquelle homem ter ar agradavel; algumas vezes póde traduzir-se por _bem_. _Fede_ exprime o contrario: _chêrá féde_, cheirar mal; _fazêl féde_, offendel-o. _Tioque_, até que; _oque_ (_oc_), _oqu'ês_, quando. Nomes hypocoristicos ou nomes de casa _Baca._ Lourenço. _Balanta._ Valentim. _Banda._ Domingos. _Barujo._ Vicente. _Beba._ Genoveva. _Bebé._ Bernabé. _Beto._ Alberto. _Beto._ Roberto. _Bibina._ Balbina. _Bina._ Etelvina. _Bocha._ Ambrosio. _Bomba._ } } Anna. _Bombina._} _Caella._ Michaela. _Caixa._ Nicolau. _Cote._ Torquato. _Chalino._ Marcellino. _Chamara._ Maximiana. _Chamaro._ Maximiano. _Chana._ Sebastiana. _Chana._ Luciana. _Chanchane._ Alexandre. _Chéché._ José. _Chella._ Marcella. _Chello._ Marcello. _Chencho._ Innocencio. _Chicha._ Narcisa. _Chichi._ Cecilia. _Chica._ Francisca. _Chico._ Francisco. _Chimí._ Cazimiro. _China._ Filippe. _Choga._ Chrysostomo. _Choncha._ Sebastião. _Chubanta._ Martha. _Chumpa._ Paula. _Cobra._ Francisco. _Coco._ Simoa. _Coima._ Paulo. _Colaça._ Nicolaça. _Cuna._ Joaquina. _Dada._ Felicidade. _Damás._ Damasio. _Delba._ Amaro. _Dico._ Frederico. _Didi._ Claudina. _Dindino._ Bernardino. _Dique._ Henrique. _Doca._ Theodora. _Doco._ Theodoro. _Doli._ Isidoro. _Doria._ André. _Dunda._ Domingos. _Jéjé._ José. _Faia._ Raphael. _Fan._ Estephania. _Fina._ Josephina. _Fita._ Antonio. _Fonfon._ Affonso. _Fronha._ Luiza. _Gena._ Eugenia. _Gruida._ Margarida. _Ia._ Maria. _Lela._ Magdalena. _Lelencha._ Florencia. _Lelencho._ Florencio. _Lena._ Helena. _Lorma._ Jeronymo. _Lota._ Izabel. _Maja._ Luiz. _Mana._ Germana. _Mano._ Germano. _Maral._ Pedro. _Mongido._ Hermenegildo. _Motas._ Thimotheo. _Munda._ Raymundo. _Nhaba._ Filippe. _Nico._ Manuel. _Oiro._ Miguel. _Pelico._ Polycarpo _Penha._ Gregorio. _Pomba._ Ignez. _Potâ._ Hippolyto. _Queta._ Henriqueta. _Quinquina._ Joaquina. _Ramal._ Antonio. _Roda._ Andreza. _Ronda._ Agostinho. _Supro._ Cypriano. _Tancha._ } } Constança. _Tantancha._} _Tantana._ Victoriana. _Tantano._ Victoriano. _Tatacha._ Anastacia. _Tatacho._ Anastacio. _Tetêa._ Dorothea. _Têtês._ Matheus. _Tilia._ Mathilde. _Tinho._ Martinho. _Tino._ Faustino. _Tintim._ Valentim. _Tintina._ Catharina. _Tólo._ Bartholomeu. _Touco._ Victor. _Tuda._ Gertrudes. Ás formações hypocoristicas que têem limitadissima extensão em Portugal, abriu-se um campo novo nos dialectos fóra da Europa; algumas d'essas fórmas vieram de lá para a metropole, como _Juca_, _Nhónhô_, etc. É difficil e em parte impossivel achar as relações que existem entre algumas d'essas fórmas hypocoristicas de Santo Antão e as usuaes correspondentes; para algumas não haverá até talvez relação etymologica; mas a difficuldade provém principalmente do pequeno numero das fórmas que conhecemos, que não nos permittem reconhecer todas as variedades dos processos, a que devem a existencia. As fórmas difficeis de reduzir ou irreductiveis, em a nossa lista são: _Baca_, _Banda_, _Barujo_, _Bomba_ (e _Bombina_), _Caixa_, _China_, _Choga_, _Choncha_, _Chubanta_, _Chumpa_, _Cobra_, _Coco_, _Coima_, _Delba_, _Doria_, _Dunda_, _Faia_, _Fita_, _Fronha_, _Lota_, _Maja_, _Maral_, _Nhabo_, _Oiro_, _Pelico_, _Pomba_, _Potâ_, _Ramal_, _Roda_, _Ronda_, _Touco_ (32 fórmas). As outras fórmas hypocoristicas de Santo Antão provém das usuaes correspondentes por processos de formação em geral perfeitamente regulares. O processo mais geral é o da simples apherese de todos os elementos que precedem a syllaba accentuada; essa alteração raramente é a unica que se dá: quasi sempre se complica com outras. Em poucos casos a apherese deixa de fazer desapparecer todas as syllabas que precedem a accentuada (vid. infra _Mongido_ e _Chamaro_). Formação por apherese _A._ Simples apherese. _Caela_ de _Michaela_. _Colaça_ » _Nicolaça_. _Fina_ » _Josephina_. _Lena_ » _Helena_. _Mano_ de _Germano_ _Queta_ » _Henriqueta_. _Tinho_ » _Martinho_. _Tino_ » _Faustino_. Em: _Ia_ de _Maria_ a apherese estendeu-se á consoante inicial da syllaba accentuada. _B._ Apherese complicada com outros phenomenos phoneticos. 1) Modificações nas vogaes finaes: _Cate_ de _Tor-quato_. _Dada_ » _Felici-dade_. _Gena_ » _Eu-genia_. _Mota-s _ de _Ti-motheo_. _Munda _ » _Raymundo_. 2) Apocope: _Fan_ de _Este-phania_. 3) Apocope com retracção do accento: _Tólo_ de _Bartholo-meu_. 4) Alteração da vogal accentuada: _Cuna_ de *_Quina_ de _Joa-quina_. 5) Quéda de _r_ da syllaba accentuada, com ou sem modificação das vogaes finaes: _Beto_ de *_Berto_ de _Al-berto_. _Beto_ » *_Berto_ » _Ro-berto_. _Dico_ » *_Drico_ » _Fre-drico_, _Frederico_. _Guida_ » *_Grida_ » _Mar-grida_, _Margarida_. _Tuda_ » *_Trudes_ » _Ger-trudes_. 6) Modificações nas consoantes das syllabas conservadas: a) _v_ em _b_. _Beba_ de *_Veva_ de _Genoveva_. _Bina_ » *_Vina_ » _Etel-vina_. b) _s_, _z_ (_ç_, _s_) em _ch_: _Chicha_ de *_Cisa_ de _Nar-cisa_. _Chello_ » *_Cello_ » _Mar-cello_. _Tancha_ » *_Tança_ » _Cons-tança_. c) _ci_, _si_, _ti_ em _ch_: _Bocha_ de *_Brosio_ de _Am-brosio_. _Chana_ » *_Ciana_ » _Lu-ciana_. _Chencho_ » *_Cencio_ » _Inno-cencio_. _Chana_ » *_Tiana_ » _Sebas-tiana_. Em _Bocha_ houve quéda de _r_ como em _Beto_, _Tuda_, etc., mudança de _o_ em _a_ como em _Munda_. d) Mudança de _ç_ em _ch_ com alteração n'uma vogal protonica: _Chalino_ de *_Cellino_ de _Mar-cellino_. e) Mudança de _ç_ em _ch_ e desapparecimento d'uma consoante: _Chico_ de *_Cisco_ de _Francisco_. _Facico_ é a pronuncia pathologica do nome _Francisco_. f) Alterações diversas regulares de consoantes (complicadas n'alguns casos com modificações vocalicas). Assimilação de _ld_ em _ll_ (_l_): _Tilia_ de *_Tilde_ de _Ma-thilde_. Assimilação de _ld_ em _d_: _Mongido_ (_Mengido_) de *_Menegildo_ de _Hermenegildo_. _r_ em _l_, _n_ em _r_: _Lorma_ de *_Ron(y)mo_ de _Je-ronymo_. _r_ em _l_: _Doli_ de *_Doro_ de _Isi-doro_. _r_ em _d_: _Dique_ de *_Rique_ de _Henrique_. _n_ em _r_: _Chamáro_ de *_Chimiano_ de _Ma-ximiano_. _n_ em _l_: _Lela_ de *_Lena_ de _Magda-lena_. g) Alteração consonantal irregular: _Doca_ de *_Dora_ de _Theo-dora_. h) Alteração da consoante da syllaba accentuada com apocope de syllaba: _Chimí_ de *_Zimí_ de _Ca-zimiro_. _C._ Apherese e reduplicação: 1) Sem apocope: a) _Bibina_ de *_Bina_ de _Bal-bina_. _Chanchane_ » *_Chane_ (_Chandre_) » _Alexandre_. _Dindino_ » *_Dino_ » _Bernar-dino_. _Lelencho_ » *_Lencho_ (_Rencho_) » _Flo-rencio_. _Tantancha_ » *_Tancha_ » _Constança_. _Tatacho_ » *_Tacho_ » _Anas-tacio_. _Tetea_ » *_Tea_ » _Doro-thea_. _Tetés_ » *_Tés_ (_Teus_) » _Ma-theus_. b) _Bebé_ » *_Bé_ » _Berna-bé_. _Chéché_ » *_Ché_ » _José_. _Jéjé_ » *_Jé_ » _José_. _Quimquim_ » *_Quim_ » _Joa-quim_. _Tintim_ » *_Tim_ » _Valen-tim_. 2) Com apocope: _Didi_ de *_Di_ (_Dina_) de _Clau-dina_. _Fonfon_ » *_Fon_ (_Fonso_) » _A-fonso_. _Chichi_ » *_Chi_ (_Chilia_) » _Ce-cilia_. _Chichi_ póde explicar-se tambem por apocope. 3) Com syncope: _Tantano_ de _Tano_ (_Trano_, _Triano_, _Toriano_) de _Vic-toriano_. _Tintina_ » _Tina_ (_Trina_, _Tarina_) » _Ca-tharina_. Formação por apocope (sem apherese) _A._ Sem retracção do accento: _Damás_ de _Damasio_. _B._ Com retracção do accento e em geral alteração da vogal sobre que elle vae recaír: _Balánta_ de _Valentim_. _Pelíco_ » _Policarpo_. _Supro_ » _Cypriano_. Algumas das fórmas difficeis de explicar resultam sem duvida, em parte, de uma complicação de processos; _Potâ_, por exemplo, provém, de _Hypolito_ por apherese de _Hy_, syncope de _l_ com contracção de vogaes e protracção do accento, mas esta fórma permanece isolada. A derivação póde tambem, como n'outras linguas, ter representado algum papel (_Lota_==_Izabelota_). Os processos de formação que acabâmos de expor não têem nada de especial: encontram-se com simples variantes n'um grande numero de linguas antigas e modernas, falladas a distancias consideraveis, pertencendo a grupos radicalmente distinctos. Mr. Robert Mowat consagrou ás fórmas hypocoristicas um estudo muito interessante, _De la déformation dans les noms propres_, publicado primeiramente em _Mémoires de la société de linguistique de Paris_, e depois na brochura _Noms propres anciens et modernes_ (Paris, 8.^o, 1869), p. 41-59. Um grande numero de fórmas hypocoristicas germanicas acha-se estudada na obra especial de Franz Stark, _Die Kosenamen der Germanen_ (Wien, 1868, 8.^o), em August Fick, _Die Göttinger Familiennamen_ (Programma do _Gymnasium and Realschule erster Ordnung zu Göttingen_. Göttingen, 1875, 4.^o), em Ludwig Steub, _Die Oberdeutschen Familienamen_ (München, 1870, 8.^o peq.) Nos _Studien zur romanischen Wortschöpfung_ von Carolina Michaëlis ha uma collecção interessante de fórmas hypocoristicas romanicas (p. 70 ss). São essas as obras que temos á mão sobre o assumpto, mas ha outras que d'elle se occupam, como a de August Fick, _Griechische Eigennamen_. Vamos extrahir d'essas obras alguns exemplos que provam a existencia de leis geraes nas formações hypocoristicas. Na Biblia _Aram_ (Gen. 22, 21) e _Ram_ (Job. 32, 2) designam o mesmo personagem; o mesmo se dá com _Jaziel_ (Chr. I, 15, 20) e _Aziel_ (Chr. I, 15, 18). Mowat, que cita esses exemplos, approxima _Lazaro_ (Evangelho de S. João e de S. Lucas) de _Eleazaro_ (Livro dos Machabeos) e adduz o copta _Chael_ (cp. _Caella_ por _Michaela_ no creolo de Santo Antão), o phenicio _Karthalon_ por _Melkarthalon_, _Stembal_ por _Manastambal_ (segundo Gesenius). No grego o processo da apherese é raro; exemplo: [Greek: Kletos] por [Greek: Anakletos] A apherese com derivação observa-se em: [Greek: Stasoyla] de [Greek: 'Ana-stasie], suf. [Greek: oyla] [Greek: Stathakis] » [Greek: Ey-stathyos], suf. [Greek: ake]. Na mencionada lingua ao contrario o processo da apocope é frequente, sendo as terminações supprimidas substituidas constantemente por a final [Greek: as]; exemplos: [Greek: 'Aleksas] de [Greek: 'Aleksandros] [Greek: 'Artemas] » [Greek: Artemidoros] [Greek: Epafras] » [Greek: Epafrodeitos] [Greek: Zinas] » [Greek: Zinosoros] [Greek: Kleopas] » [Greek: Kleopatros] [Greek: Kleofas] » [Greek: Kleofantos] [Greek: Loykas] » [Greek: Loykanos] [Greek: 'Antipas] de [Greek: Antipatros] [Greek: Minas] » [Greek: Minodoros] [Greek: Nikandas] » [Greek: Nikandridas] [Greek: Olympas] » [Greek: Olympiodoros] [Greek: Olympas] » [Greek: Olympiodoros] {[Greek: Parmenidis] [Greek: Parmenas] » { ou {[Greek: Parmeniskos] [Greek: Silas] » [Greek: Siloyanos]. O inglez, com a sua tendencia para accentuar a syllaba inicial, emprega de preferencia a apocope nas formações hypocoristicas; essa apocope é complicada com outros factos phoneticos, de que mencionaremos alguns. 1. Apocope simples: _Chris_ de _Chrístian_ de _Christiánus_. _Clem_ » _Clemént_ » _Cleméntius_. _Dan_ » _Dániel_ » _Daniél_. _Tom_ » _Thómas_ » _Thomás_ ([Greek: Thômas]). _Greg_ » _Grégory_ » _Gregórius_. 2. Apocope e adjuncção de um _s_: a) Sem assimilação de consoantes: _Cutts_ de _Cuth-bert_. _Edes_ » _Ed-ward_. b) Com assimilação de consoantes: _Watts_ de _Walter_, _Gibbs_ de _Gilbert_. Comp. creolo _Motas_ de _Timotheo_. 3. Apocope com mudança de _r_ em _d_: _Dick_ de _Richard_, _Dobbs_ de _Robert_. Comp. creolo _Dique_ de _Henrique_. Nos seguintes nomes germanicos medievaes desappareceu ou a primeira ou a segunda parte: _Faro_ por _Burgundofaro_. _Giso_ » _Wartgis_. _Offa_ » _Ceolwulf_. _Prandus_ » _Rotprandus_. _Uffo_ » _Liudulfus_. _Bruna_ por _Brunihildís_. _Euva_ » _Evarix_. _Hrode_ » _Hruodolf_. _Sunna_ » _Suanilda_. _Tado_ » _Tadelbertus_. A suppressão de uma parte do nome foi seguida ou acompanhada, como se vê, de outras modificações, comparaveis em parte ás que observámos nas fórmas hypocoristicas do creolo de Cabo Verde. O processo de addição de suffixos diminutivos ás fórmas mutiladas tem grande extensão nas linguas germanicas. Exemplos: _Godi-ko_ de *_Gode_ por _Gode-fredus_. _Ghise-ke_ » *_Gise_ » _Gise-lbertus_. _Ghere-ke_ » *_Ghere_ » _Gere-hardus_. _Albi-so_ » *_Albe_ » _Albe-ricus_. _Gisle-zo_ » *_Gisel_ » _Gisel-bertus_. _Berti-nus_ » *_Bert_ » _Bert-randus_. _Feli-nus_ » *_Fel_ » _Fel-mirus_. Escolhemos agora alguns exemplos da lista das fórmas hypocoristicas francezas dadas por Mowat: _Bastien_ de _Sebastien_. _Billon_ » _Barbillon_. _Briel_ » _Gabriel_. _Brois_ » _Ambrois_, _Ambroise_. _Colas_ » _Nicolas_. _Cot_ » _Jacot_. _Delle_ » _Adèle_. _Fan_ » _Stephan_. _Fonce_, _Fons_ » _Alphonse_. _Gelle_ » _Angèle_. _Gory_ » _Grégory_. _Hippeau_ » _Philippeau_. _Guste_ de _Auguste_. _Livet_ » _Olivet_. _Mancet_ » _Clémencet_. _Mas_ » _Thomas_. _Maury_ » _Amaury_. _Nardon_ » _Bernardon_. _Pin_ » _Chopin_. _Pold_ » _Léopold_. _Randal_ » _Durandal_. _Sandre_ » _Alexandre_. _Thézard_ » _Balthazar_. _Vestris_ » _Silvestre_. Estes exemplos bastam para mostrar que as fórmas hypocoristicas creolas são o resultado da acção de leis geraes. 2. Creolo de S. Thomé Conhecemos apenas o seguinte specimen que devemos á memoria de um amigo; são versos de um portuguez que habita a ilha: Sã Ma Plantá, Senhora Maria da Apresentação, Sã Ma jabo, Senhora Maria diabo, Floli blavo, Flor brava, Bujungá. Bujungá (nome indigena) Neni d'òlo, Annel d'oiro Cun mimoia C'om argolas (memoria); Sâ za estoia, Isto é historia, Sã zetá. Senhora rejeitar, Lenço seda Lenço de seda C'uma saia, C'uma saia Mé lagaia, ? Sã zetá Senhora rejeitar. Sã Ma Plantá. Senhora Maria da Apresentação. 3. Creolo da Ilha de Sant'Iago (archipelago de Cabo Verde) Ao nosso amigo, o sr. Luciano Cordeiro, secretario da sociedade de geographia, devemos a communicação da seguinte carta, dictada por uma negra de Sant'Iago, que se exprime no creolo d'aquella ilha: _Nho Dótore._ Senhor doutor. _Mi ten sódadi cheu di nho Dótore, a má di nha Dóna L._ Eu tenho saudades muitas do sr. doutor e mais da sr.^a Dona _Mi manda mantenha, cheu, cheu, cheu._ Eu mando recommendações, muitas, muitas, muitas. _Mi a má Seyton nu está desamparados cheios di sódadi_ Eu e mais o Seyton nós estamos desamparados cheios de saudades _di nha Dotore e di nha L...._ do sr. doutor e da sr.^a _Oh! nhor Deus!_ Oh! senhor Deus! _Nha Sinhára manda mantenha cheu tambê A. cu J._ A minha senhora manda recommendações muitas tambem A. e J. _Está magro tóraqui piscóço já sae fora._ Estão magros até que (até o ponto) pescoço já sae fóra. (Isto é: está demasiadamente magro). _Agora qui já mi sabê cusa qui é falta di nho Dotore. Deos_ Agora que já eu sei cousa que é a falta do sr. doutor. Deus _al judan qui in torna, olhá nho._ ha de permittir-me que eu torne a ver sr. _Mi está na casa di nha Sinhára, mas en stá cu muito_ Eu estou na casa de minha senhora, mas eu estou com muitas, _muito sódadi di nhos tudo dós._ muitas saudades dos srs. ambos dois. _Mi é quel creada di nhós qui tâ chomado Maria._ Eu sou a creada dos srs. que se chama Maria. Este dialecto offerece naturalmente intimas similhanças com o de Santo Antão, mas revela uma maior approximação ao portuguez puro, que em parte póde ser puramente individual, poisque a negra que dictou a carta tem vivido muito com pessoas instruidas originarias da metropole. O dialecto possue um presente formado com _tá: en tá bá_, eu vou, como em Santo Antão. A negação é tambem _câ_, não; _nh'armun_==meu irmão, como em Santo Antão; _al_==_hade_, _ajudan_==_ajudar-me_, e outras particularidades coincidem ainda nos dois dialectos, e provavelmente em todos os do archipelago de Cabo Verde. Observam-nos que _nhor_ e _nhara_ por _senhor_, _senhora_ são mais respeitosos que _nho_ e _nha_ e se empregam dirigindo-se a pessoas de idade. _Nhanha_ é a senhora da casa, mãe de familia; _nhanhinha_, menina; _nhonhosinho_, menino. 4. Creolo da Guiné portugueza Tudo quanto podemos apurar sobre o creolo portuguez da Africa (continente e ilhas) se reduz ao que precede e á seguinte noticia. _De la langue, créole de la Guinée portugaise. (Notes sur la Guinée portugaise ou Sénégambie méridionale_, par M. Bertrand-Bocandé). _Bulletin de la Société de Géographie_ de Paris, 3^e série, t. XII. 73-77 (1849 juillet et août): «On conçoit que des hommes acoutumés à se servir pour manifester leur pensée, d'un idiome aussi simple, ne purent facilement élever leur intelligence au génie d'une langue européenne. Quand ils furent en contact avec les Portugais et forcés de s'entendre avec eux, en parlant une même langue, il a fallu que l'expression variée des idées acquises pendant tant de siècles de civilisation se dépouillât de sa perfection, pour s'adapter aux idées naissantes et aux formes barbares du langage des nations à demi sauvages. Le mot adopté dut conserver toujours le même son; et perdre ces désinences variées qui servent à distinguer les nombres, les genres, les pronoms, les temps ou les modes; il fut soumis seulement aux transformations absolument indispensables au discours, pour qu'il ne devînt pas uniquement des sons insignifiants. «Il se fit un retranchement graduel de toutes ces modifications qui servent à exprimer les diverses nuances de la pensée, et quand il ne fut plus possible de rien retrancher pour conserver le discours encore intelligible, l'idiome fut fixée dans sa grammaire particulière, devenue aussi simple que peuvent le permettre les règles de la grammaire générale de toute langue. Il exista alors ce que l'on appelle la langue _créole_ portugaise. «Pour se former, elle a dû d'abord se soumettre à la prononciation habituelle des peuples d'Afrique. Ceux-ci ne peuvent, comme je l'ai déjà dit, prononcer les deux sons représentés par _je_ et _che_ qui sont devenus _ie_ et _kie_. «Les noms n'eurent plus de terminaison pour distinguer les _nombres_; on doit désigner la quantité de l'objet, ou dire s'il y en a peu, ou beaucoup. Le _genre_, en parlant des animaux seulement, se fait connaître en ajoutant au nom les mots _homme_ ou _femme_; on dit donc par exemple: un _boeuf homme_, un _boeuf femme_. «Il fallut adopter des pronoms. Il y a des pronoms personnels pour les différentes personnes et le nombre de ces personnes. «Le radical des verbes se termine toujours par une voyelle: on en a retrauché l'_r_; et ce radical peut être employé comme substantif, ou comme verbe. «Les pronoms ajoutés au verbe désignent seuls les personnes; il n'y a pas de désinences différentes pour les déterminer. «Quand aux temps _présents_, _passés_ et _futurs_, il fallait nécessairement un moyen de les distinguer. «Le _présent_ se fait connaître de deux manières, ou bien en ajoutant simplement l'un des pronoms au radical, ou bien, au moyen du verbe _être_ suivi du mot _na_, qui signifie _dans_ et au radical: ainsi pour dire _j'écris_, on emploie cette tournure _moi écris_, ou _mois est dans écri_, qui équivaut à _je suis à écrire_; le passé se désigne avec la particule _ia_, (_déjà_), mis avant ou après le radical; _ta_, placé devant marque un temps _futur_; _va_, après, forme l'imparfait; enfin _ta_ précédant et _va_ suivant le radical indiquent le mode conditionnel. «J'ai connu au poste français de Séyou un de ces Papels-manjaga que l'on appelle portugais, qui était devenu sergent de poste; il n'avait pu apprendre le français; mais il avait adapté à notre langue le mécanisme de la langue créole portugaise, et se serait parfaitement fait entendre de quelqu'un qui en aurait eu la clef; ses commandants avaient beaucoup de peine à le comprendre. Ainsi il disait _moi faire_ ou _mois est na faire_, pour dire je fais; _moi ia faire_, j'ai fait; _moi faire va_, je faisais; _moi ta faire_, je ferai; _moi ta faire va_, je ferais ou j'aurais fait. «Le créole portugais n'est donc qu'une altération de la langue portugaise; il est composé de beaucoup de mots de cette langue dont quelques-uns sont hors d'usage aujourd'hui, de mots espagnols, et d'autres empruntés aux langues des peuples qui entourent ses différentes factoreries. «Ce créole varie dans chaque lieu: il a des mots, des expressions, une accentuation et même quelquefois une ordre grammatical plus ou moins différents, suivant la langue qui a dominé pour faire subir ses modifications à la langue portugaise, qui est toujours partout le fondement du créole. «Dans la Guinée il ressemble à celui des îles du cap Vert; mais dans celle-ci on peut dire qu'on remarque autant de dialectes qu'il y a d'îles, et dans celle de San-Thiago seule, les créoles de la Villa da Praya, du centre de l'île et de Terrafal, et de San-Miguel offrent des changements notables: plus on s'approche de la Villa da Praya, plus le créole ressemble au portugais. Dans la Guinée, le créole de Bissao sera mêlé davantage d'expressions _papels_, celui de Ziguichor, de _bagnoun_ ou de _floup_, celui de Farim et de Géba de _mandingue_. «Cet idiome se modifie encore suivant les personnes qui le parlent: la position sociale, l'éducation, les habitudes, influent d'une manière aussi remarquable pour l'expression créole que pour les langues les plus parfaites. Il est facile à la personne la moins exercée en entendant le créole, de deriver le rang ou l'éducation de celui qui le parle. On entendra même des personnes, quoique sans instruction, s'exprimer dans cet idiome avec une facilité et une grâce que l'on ne pourra s'empêcher d'admirer; ils savent parfaitement en tirer parti, quoiqu'il paraisse si ingrat, pour composer des récits intéressants, et improviser des chansons dans lesquels la vérité des images et les circonlutions suppléent aux expressions qui manquent dans le langage, et dépeignent souvent élégamment les idées qu'ils veut suggérer. «Des personnes instruites qui tiendront une conversation en créole, se garderont difficilement de mêler dans leurs discours des expressions, des tournures empruntées à la langue portugaise, et principalement s'ils veulent exprimer quelque idée abstracte qui n'a point de mots en créole. «D'un autre côté, il est presque impossible à un Portugais habitué long temps à ne parler que le créole, de se soustraire à une funeste habitude; des mots, des expressions, des phrases créoles se rencontreront dans sa conversation, dans ces écrits. Et s'il n'est pas soutenu par une connaissance profonde de sa langue, il la confondra bientôt avec le créole qu'il ne pouvait d'abord entendre, il finira même quelquefois par parler un langage qui ne sera ni portugais, ni créole, car il n'en aura que le mécanisme.» 5. O portuguez no Brazil O Brazil com as suas 873:000 milhas quadradas, povoadas, é verdade por emquanto apenas por uns 10 milhões de habitantes, offerece um campo vasto á alteração do portuguez, á qual se oppõe porém a extensão crescente da litteratura, e especialmente do jornalismo. Como o dominio litterario da velha metropole europêa não cessou com o dominio politico, a linguagem litteraria do grande imperio da America meridional não se afasta senão n'algumas peculiaridades de importancia secundaria do portuguez da Europa. A linguagem fallada distingue-se, já na bôca dos mais instruidos, por essa entoação geral, por essa tendencia determinada para tornar abertas todas as vogaes atonas, por esse amor do iotacismo, que nos fazem reconhecer ao fim da primeira phrase pronunciada por um brazileiro ou pessoa que se adaptou á pronuncia brazileira a sua proveniencia. Na linguagem popular, especialmente das provincias, na linguagem dos _matutos_, notam-se modificações phoneticas mais consideraveis, a mais geral das quaes é a suppressão do _r_ final, que permitte rimas como a que nos apresenta a seguinte quadra popular: Mariquinhas morreu hoje, Hoje mesmo s'éntirou: Sobre a sua sipultura Nasceu um pé de firô (flor). O vocabulario brazileiro apresenta naturalmente muitos termos compostos ou derivados de termos portuguezes, mas desconhecidos na nossa lingua da Europa, e um numero assás consideravel de termos provenientes dos dialectos indigenas, o _tupi_ e o _guarani_, e ainda de outras linguas americanas; as linguas africanas ministram tambem alguns termos. Uma parte das palavras peculiares do portuguez do Brazil foram já reunidas em um _Vocabulario brazileiro_, por Braz da Costa Rubim (Rio de Janeiro, 1853. 8.^o). Damos em seguida uma serie de versos populares do Brazil. As cantigas n.^{os} 1 e 4 a 12 foram-nos communicadas por um amigo; 2 e 3 acham-se na _Noticia da provincia de Mattogrosso_, por Joaquim Moutinho, p. 19; n.^{os} 13 a 20 acham-se na comedia _O matuto na côrte_ por Antonio Augusto de Araujo Correão. Rio de Janeiro, 1863. 1. Cantiga de pretos Qui é queli santo Qui! vai no andô? É San Binidito É nosso sinhô. Chi, cha. 2. Cantiga dos cururueiros de Matto-grosso Em cima d'aquelle morro Siá dona Tem um pé de jatobá. Não ha nada mais pió Ai, siá dona, Do que um home se casá. 3. Desafio dos cururueiros HOMEM. Eu passei o Parnahyba, MULHER. Dizem que a muyé é farça Navegando numa barça, Tão farça como papé, Os peccados vem da saia, Mas quem vendeu Jesus Christo. Mas não pode vir da carça. Foi home, não foi muyé. 4. 7. Quando mozo vai ni rua, Zi eu vi, [~u]a baráta Camiza cheia di renda. No capóte di vóvó, Quitanda sei a qui reva: Quando eu fui prá pegálla Por fóça que acha venda. Báteu ázas e vóó. 5. 8. Zi criorinha dim Ba'ía. Minha Avó quando é di noite Za não come bacai'ao; Custumava-se a banhá, Come só óvátáfá Quando entra na gaméra Cucu, farinha di páo. Começa rogo a chorá...! 6. 9. Zi criorinha dim Ba'ía Zi um gustinho lhe quero dá Quando vai lává ó má, Dá minha bunda quábráda Deixáram as água turva, Québra a bunda, mexe bunda Sendo ellas um cristá. Québra a bunda de Sinhá. Québra a bunda, mexe bunda Québra a bunda di iá-iá. 10. O negra trás café, chá e pão torrado, Para dar ó sôr pintor: vae pintar o meu sobrado. De verde amarello e incarnado; Onde eu faço o meu gingado. 11. 15. Minha mulatinha, Sô Mané diz que não qué Meu muracujá Que o rato caia no mé, A maré é boa, As alegria dos Cabanos Vamous embarcá É matá os pápa mé. Á beira do rio, Olé! Olé! Á borda do má: Eu sou artilheiro Que sei atirá. 16. Peixinho do rio, Camarão do má: Minha mulatinha Esta vai por despedida Diz-me o teu nome. Por dentro d'esta liminha. --Eu mi chamo botão Ora viva Sinhá Dona Do calção do home. Sinhá Insolencia Zephina. Marca o passo, moça, barabos! 12. Patury não se come sem limão, As mulata me chamão cidadão. --Chiáu, ó rapariga! --Que pede, ó sinhó! 17. --Chiáu quer vir cumigo? --Sen surda, sinhó, --Chiaú, eu do dinheiro, Minha caboca bónita --Percebo, sinhó. Sapateia no tijolo, --Então, ven ja cumigo. Que a barra do teu vestido --Já, já, vou, sinhó. É prata e parece ouro. 13. 18. --Minha gente não inore Ai a viola está com fóme Este meu cantar baixão! E a prima está c'uma dô, Estou com o peito cerrado. Minha gente venhão vê D'um marvado catarrão. Que bahiano gemedô. --Senhô mestre cantadô, Ai que me mandou cantá, 19. Quero que me dê por conta Ai os peixe que tem no má. Diga lá, Senhó Doutô, Ai os peixe que tem no má Que aprendeu a lussophia, Carrego no meu chapéo, Qual é a ave que avôa Ai quero que me dê por conta. E que dá leite quando cria? Ai as estrellas que tem no céo. --Você me mandou cantá 20. Ai pensando que eu não sabia, Eu não sou cumo a cigarra Que no cantá leva o dia. Por favô, Senhô doutô, Me adecifre esta conta Vinte e cinco guardanapos 14. Com dois gintem em cada ponta? Sim senhô, eu advinho Ai! sô mestre cardereiro Sem fartá nem um dé réis, Metta a mão na mêladura, Doze pátacas e meia Que a canna do Lavradô Vem a ser quatro mim réis. Só que dá é rapadura. Diversas particularidades caracteristicas dos dialectos creolos repetem-se no Brazil; tal é a tendencia para a suppressão das fórmas do plural, manifestada aqui em que, quando se seguem artigo e substantivo, adjectivo e substantivo, etc., que deviam concordar, só um toma o signal do plural. Assim na cantiga n.^o 20: _dois gintem_==dois vintens. Ouve-se com frequencia _os homen_ por _os homens_; _as muyé_ por _as mulheres_; _duas boa pessoa_ por _duas boas pessoas_; _casas grande_ por _casas grandes_, etc. Mencionaremos ainda o habito de dar fórmas diminutivas aos pronomes: _ellasinha_==ella (referindo-se a uma menina); _umasinha_==uma (referindo-se a uma creança, a um animal, a uma cousa pequena). _Tens um cão? Tenho umzinho_ (isto é um cão pequeno). 6. Dialecto portuguez de Ceylão ou indo-portuguez A primeira noticia que tivemos d'este dialecto achámol-a na obra de A. A. Teixeira de Vasconcellos, _Les contemporains portugais, espagnols et brésiliens_, t. I. _Le Portugal et la Maison de Bragance._ Paris, 1859, 8.^o, pag. 115-116, em que se acha um curtissimo extracto da parabola do semeador em indo-portuguez. A obra de lord Stanley _The three voyages of Vasco da Gama_ ministrava-nos depois um excerpto mais extenso (Genesis, cap. III). Depois, como já dissemos, reunimos assás abundantes materiaes para o estudo do dialecto. Hoje limitâmo-nos á parte historica e bibliographica, e no nosso ultimo capitulo indicaremos os principaes pontos de contacto entre o indo-portuguez e os dialectos similhantes. Em 1503 Lourenço d'Almeida submetteu um dos reis mais poderosos da ilha de Ceylão, Boenago Pandar. Por esse tempo foi fundada a fortaleza de Colombo e deu-se o commando da ilha a um capitão portuguez[3]. O terceiro viso-rei da India Lopo Soares fundou ali um estabelecimento commercial em 1517, que porém decaíu. Só pela morte de D. João Dharmapala, que legou os seus dominios ao rei de Portugal, então Filippe I (1581), é que os portuguezes adquiriram titulo á soberania da ilha, com excepção de Jaffna, de que reconheciam ainda o rei nominal, e de Kandy, em cujo throno elles queriam assentar a rainha Catharina. Apesar dos portuguezes desejarem impor suas leis e costumes, ficaram de pé as antigas leis e privilegios da ilha. N'esse periodo e no seguinte as guarnições dos fortes portuguezes regulavam por 20:000 homens, dos quaes apenas menos de 1:000 eram europeus. Colombo desenvolveu-se então muito: edificaram-se conventos, igrejas, hospitaes, e quando caíu em 1656 nas mãos dos hollandezes residiam lá mais de 900 familias nobres, alem de 1:500 familias de empregados da justiça, commerciantes e negociantes. Em 1617 os portuguezes assenhorearam-se á mão armada de Jaffna. A alliança dos hollandezes com o rei de Kandy foi o ponto de partida para o seu dominio na ilha. Em 1658 tornaram-se senhores de todo o littoral e terras baixas e expelliram os portuguezes, tratando de destruir todos os vestigios da nossa influencia. As igrejas catholicas foram substituidas por igrejas protestantes; a lingua portugueza, que durante o nosso tão curto dominio se implantára na ilha sob uma fórma dialectal, ao lado das linguas indigenas, o singalez e o tamul, foi perseguida. Rapava-se a cabeça de todos os escravos que fallavam portuguez; multavam-se por negligencia os seus senhores: os hollandezes esperavam assim, como diziam n'uma proclamação «destruir a lingua dos portuguezes para que o nome dos nossos inimigos pereça e o nosso proprio floreça em seu logar». (Emerson II, 70.) «O dominio da Hollanda em Ceylão foi quasi igual em duração ao de Portugal, cerca de um seculo e quarenta annos, mas a politica dos dois paizes deixou uma muito differente impressão do caracter e instituições do povo em cujo seio elles viveram.» (Emerson II, pag. 70.) Ha uma palavra portugueza que os hollandezes não perseguiram, antes aproveitaram como fonte de receita. O titulo de _dom_ era muito estimado pelos indigenas de Ceylão: os portuguezes permittiam o seu uso pela quantia de alguns centos de dollars. Escrevia-se o nome do comprador n'uma placa de prata com o desejado _dom_ á frente; o comprador ajoelhava ante o governador ou pessoa por elle regularmente auctorisada; collocava-lhe a placa na cabeça e a auctoridade dizia: Levanta-te, dom Fulano. Os hollandezes continuaram a vender o _dom_ rendoso, reduzindo o preço, que chegou por fim a dez dollars, tornando-se assim accessivel ás bolsas modestas. Hoje ainda a ilha está cheia de dons. O hollandez foi esquecido totalmente, até pelos descendentes dos que o fallavam; a repressão odienta não poude ao contrario destruir o portuguez. Senhora da ilha desde 1796, a Inglaterra adoptou uma politica diversa da dos seus predecessores: os inglezes estudaram o indo-portuguez, como elles chamam ao dialecto portuguez de Ceylão; deram-lhe uma pequena litteratura, de que damos mais abaixo noticia, e serviram-se d'elle como meio de propaganda politica e religiosa. Muito mais facil de estudar que as linguas indigenas, o tamul que, é fallado na costa norte, e o singalez, fallado ao centro e na costa sul, comprehendido por muitas familias principaes das cidades, que ainda se ensoberbecem com o seu _dom_, os seus nomes portuguezes, precedendo os appellidos indigenas, o indo-portuguez era um instrumento precioso que os inglezes com o seu genio administrativo não podiam deixar de aproveitar. As informações que reunimos sobre a extensão e importancia actual do indo-portuguez não são sufficientes para formar sobre este assumpto um juizo inteiramente seguro. Um missionario que esteve na ilha escrevia, em data de 13 de novembro de 1875, que o indo-portuguez é quasi exclusivamente a lingua dos descendentes dos portuguezes e hollandezes que se estabeleceram na ilha; que a lingua não é considerada pelos missionarios como importante meio de instrucção, tanto quanto os que a usam fallam outra lingua; que os missionarios Wesleyanos têem um serviço publico em portuguez em Colombo e em duas ou tres cidades; que o dialecto está em extrema decadencia, e que com o curso de outra geração se extinguirá totalmente. O missionario que deu estas noticias não estava, porém, bem informado, porque diz que o indo-portuguez não tem grammatica nem diccionario, o que nós sabemos não ser exacto. Um outro missionario, que residiu tambem em Ceylão, descreve com data de 20 de março de 1877, que durante o exercicio das suas funcções de missionario em Ceylão não encontrou uma só pessoa com quem o portuguez podesse ser empregado como meio de conversação; que nos districtos do norte e do oriente da ilha o portuguez está quasi inteiramente extincto; que a missão tinha deixado de o empregar para o serviço publico havia alguns annos, ao norte da ilha; que ao sul estava em rapida decadencia. Alguns testemunhos, em verdade anteriores aos d'esses missionarios, cujas informações devemos ao nosso bom amigo rev. R. H. Moreton, attribuem ao dialecto maior importancia e extensão; a bibliographia que damos mais abaixo depõe tambem n'este sentido. Na _Cruz de Christo_ lê-se: «O auctor te da sua guardismento per o publico, per o modo ne qual sua _Versos sagrada_ tinha recebido; dos cento e cincoenta livrinhos de aquel tinha impressado e vendido per o povo quem te sabe portuguez; esti lingoa mais que assi corrupto, tem papiado extensivomente nesti Ilha, e tem ainde doci, mellifluozo, como seu parente Frances e Italiano». «O indo-portuguez é mais ou menos entendido por todas as classes na ilha de Ceylão e por toda a costa da India; a sua extrema simplicidade de construcção e facilidade de acquisição tendo-o posto extensamente em uso como um meio de trafico. Mas o povo de que é vernaculo e que, em Ceylão só, sobe a mais de 50:000 individuos, é constituido por descendentes dos hollandezes e portuguezes, os primeiros dominadores (europeus) da India.» _The Bible of Every Land_, pag. 275-276. Damos em seguimento a nota bibliographica das publicações em dialecto portuguez de Ceylão ou relativas a elle, de que até hoje tivemos conhecimento; as que não possuimos e nem sequer vimos vão indicadas com o signal [++]. _Bautismo: sua subjectos e modo de sua administração. Parte premeiro: Tocando o bautismo de nocentes._ Colombo: impressado ne officia de Missão Wesleyano. 1869, 44 pp, in-12. _Bom novas._ N.^o 15. March. 1869. p. 57-60. Colombo: printed at the Wesleyan Mission Press. É um numero de um pequeno periodico religioso. _Cantigas por adoração publico em lingoa portugueza de Ceylon._ De Robert Newstead, missionario wesleyano. Terceiro vez impressado. Colombo impressado ne officina Wesleyana. 1823. 8.^o 22-4 pp. (de index). [++] _Compendium (A) of the Ceylon-portuguese language_ by W. B. Fox. Colombo. 1859. _Cruz (A) de Christo._ Colombo: Impressado ne officio de A. H. Peterson. 1859. 23 pp. A _Intrudição_ acha-se subscripta por J. A. C. No nosso exemplar acha-se o nome manuscripto por inteiro: John Arnold Cristophelaz. [++] _Dictionary (A) in the Singhalese, Portuguese and English languages._ Second edition, enlarged. By W. B. Fox, Wesleyan Missionary. (Publicado em 1820). _Fórma (A) da oração publico e administração dos Sacramentos, conforme ao uso da Igreja Inglaterra. Traduzido, por o missão, em lingua portuguez de Ceylon._ Pelo Robert Newstead, missionario Wesleyano. Em Colombo: Impressado na officina Wesleyano. 1820. 44 pp. [++] _Grammatical (A) Arrangement on the method of learning the corrupted portuguese as spoken in India_, by Berrenger. Sec. edit. Colombo, 1811. Indicação do sig. Teza no artigo alludido infra. _Horte de paraiso. Em o nome de o Jesus crucificado._ (XIV orações.) Impressado ne Officio de Baptiste Missionarios, Kandy. 32 pp. _Hum caminho per inferno._ Folha avulsa, 1 p. _Hum catecismo per o ensino de criances ne o principiô de relize, e hum curto catecismo de o nomis ne o escritura._ Colombo: impressado ne officio de Wesleyanos. 1837. 12 pp. _Indoportoghese._ E. Teza. 8.^o 10 pp. Estratto dal Periodico:--Studi Filologici, Storici e Bibliografici Il Propugnatore. Vol. V. É o primeiro estudo scientifico sobre este dialecto. [++] _Instructions for children._ By the late Rev. John Wesley, A. M. of the University of Oxford. In portuguese and english. (Publicado antes de 1820.) _Meditacãos e oracãos_ (sic) _sober differenti subjectos e por differenti casiãos._ J. Campbell, Printer, Hulfsdorp Press. 50 pp. 4.^o peq. _Novo (O) Testamento de Nosso Senhor e Salvador Jesus Christo, traduzido ne indo-portugueza._ Colombo, officina de Missão Wesleyano, 1852. 8.^o _Oraçãos, Dez Mandamentos, O sermão riba do montanha._ 16 pp. _Psalterio (O), ou Psalmos de David, como apontado a ler nas igrejas. Traduzido em lingoa portugueza de Ceylon, e publicado por a Sociedade Biblia de Colombo._ A Colombo: Impressado na officina Wesleyano. 1821. 8.^o 102 pp. _The singhalese Tract Society_, n.^o 6, 1856. _O Serpente de Cobre._ 8 pp. No fim acha-se a indicação: Preço hum challi de-cobri, huma ou senao oito fanam hum cento. _Voz de verdade._ (Pequeno periodico religioso mensal; temos alguns numeros desde 1 de outubro de 1870, em que começou a publicar-se, até janeiro de 1873. Sem logar de impressão.) 4 pp. cada numero. _Vocabulary (A) in the Ceylon Portuguese, and English Languages, with a series of Familiar Phrases._ By John Callaway, Wesleyan Missionary. Colombo: Printed at the Wesleyan Mission Press. 1820. Price six fanams. 44 pp. in 12.^o A maior parte das publicações mencionadas que possuimos devemol-as á dedicação do nosso bom amigo o rev. R. H. Moreton, que se empenhou para com a missão Wesleyana e missionarios seus amigos para nol-as obter. Na obra: _The Bible of Every Land, a history of the Sacred Scriptures in every language and dialect into which translations have been made_, etc. London, Samuel Bagster and Sons. 4.^o, p. 275-276, achâmos as seguintes noticias com relação ás traducções do Antigo e Novo Testamento em indo-portuguez. «Com o declinar dos governos portuguez e hollandez na India, os membros d'estas nações foram deixados sem meios de instrucção religiosa excepto os que offereciam os missionarios catholicos romanos; e em consequencia, o catholicismo romano tornou-se a fórma prevalecente da sua religião. Em 1817, Mr. Newstead, missionario wesleyano, que residia em Negombo, em Ceylão, começou uma traducção do Novo Testamento para beneficio espiritual d'este povo. Partes d'esta traducção foram lidas por Mr. Newstead do pulpito, e foram tambem emprestadas livremente a pessoas doentes, uma das quaes, diz-se, morreu com o evangelho de S. João debaixo do travesseiro. O povo mostrou tanto interesse pela obra, que uma edição impressa foi em breve resolvida, e, em 1819, a versão do evangelho de S. Matheus foi publicada em Ceylão, á custa da Sociedade biblica auxiliar de Colombo; e os psalmos seguiram-se, em 1821, á custa da mesma sociedade. «Pouco depois Mr. Newstead completou a sua traducção do Novo Testamento, e a obra foi submettida a uma miuda revisão por uma commissão nomeada para esse fim, consistindo de tres missionarios e de seis dos mais intelligentes indo-portuguezes. A revisão foi terminada em 1824; e Mr. Newstead emprehendeu uma viagem a Inglaterra para sollicitar o auxilio da Sociedade biblica ingleza e estrangeira para a publicação da obra. A traducção foi recommendada com instancia á adopção da commissão pelo rev. T. J. Twisleton, archidiacono de Ceylão; e, como o seu valor foi attestado por outros juizes competentes, duas edições foram impressas em Londres, a expensas da sociedade, em 1826, sob a superintendencia pessoal de Mr. Newstead. A segunda edição do Novo Testamento, consistindo de 5:000 exemplares, appareceu em Colombo em 1831; e, no anno seguinte, uma versão dos livros do Genesis, Exodo, e parte do Levitico foi publicada no mesmo logar, a expensas da mesma sociedade. O Pentateucho e o Psalterio foram impressos em Colombo, em 1833, n'uma edição de 5:000 exemplares; annuncia-se como estando em progresso a traducção de todo o Antigo Testamento. «Uma outra edição do Novo Testamento indo-portuguez foi mais recentemente emprehendida, e projectou-se no começo imprimil-a em Londres, sob a inspecção de Mr. Newstead, o traductor, e á custa da Sociedade biblica ingleza e estrangeira. Mas Mr. Newstead, depois de muitos annos de ausencia de Ceylão, não sentiu sufficiente confiança no seu conhecimento da lingua para fazer imprimir o Novo Testamento; e em consequencia d'isso resolveu-se imprimir só o evangelho de S. Matheus em Londres, para fim provisorio, emquanto a impressão da obra inteira seria confiada a missionarios residentes em Ceylão, com a vista de a imprimir na imprensa da missão n'aquella ilha. O evangelho de S. Matheus foi acabado em 1852, sob a superintendencia de Mr. Newtead. Deram-se ao mesmo tempo instrucções para a impressão em Colombo de 2:000 exemplares do Testamento inteiro, á custa da Sociedade biblica ingleza e estrangeira. Esta edição foi completada em 1853, sob o cuidado de uma commissão de revisão escolhida para esse fim.» Eis um specimen do dialecto: O sermão riba do Montanha Ne Evangelho de São Matheus Capitulo V[4] E Jesus olhando o multidãos (de gentes) ja foi riba de hum montanha, e elle quando ja santa sua disçipulos ja chegar perto per elle. 2 E Jesus ja abri sua boca, e ja ensina per elotros fallando. 3 Bendito _tem_ os pobres ne espirito, porque per elotros tem o reyno de ceo. 4 Bendito _tem_ elotros quem tem tristes, porque elotros lo ser consolados. 5 Bendito _tem_ elotros quem tem paçiente ne coraçaõ (humildes), porque elotros lo herida o terra. 6 Bendito _tem_ elotros quem te senti fome e securo por justiça, porque elotros lo ser enchido, (per elotros lo tem baste). 7 Bendito _tem_ o gentes misericordioso, porque elotros lo acha (reçebe) misericordia. 8 Bendito _tem_ os limpos ne coraçaõ, porque elotros lo olha per Deus. 9 Bendito _tem_ o gentes quem te faze paz, porque elotros lo ser chomado filhos filhas de Deos. 10 Bendito _tem_ elotros quem te suffri (padeçe) per o causo de justiça: porque per elotros tem o reyno de ceo. 11 Bendito tem vosoutros quando _gentes_ te engeita per vosoutros, e perseguir _per vosoutros_, e te falla toquando de vosoutros, tudos sortes de mal, falsamente, sem rezaõ por o causo de mi. 12 Allegré com muito grande allegria, porque vossas paga ne ceo _tem_ grande, porque assi (mesmo modo) elotros ja perseguir per os prophetas, quem tinhe antes (mais diante) vosoutros. 13 ¶ Vosoutros tem o sal de terra, mas si o sal ja perdi aquel so sabor, acquel com que lo ser salgado? aquel despois nunca valé nada, senaõ per fica pinchado fora, e per fica massado baixo de pes de gente 14 Vosoutros tem o lume de o mundo, hum cidade que tem riba de um montanho non pode ser escundido. 15 Nem gentes nunca sandé hum candecera e (despois) aquel bota baixo de hum medida, mas riba hum candeler, e aquel te da lumi per tudos (pessaõs) quem tem ne caza. 16 Vossas lumi desse luzi diante de gentes, que vossas bom fazeres elotros pode olha, e glarifica per vossas Pai quem tem ne ceo. 17 ¶ Naõ lembra que eu ja vi per destrui o lei ou o prophetas, eu nunca vi per destrui, mas per guarda (per faze) aquel lei. 18 Em verdade eu te falla per vosoutros, (que) ate que ceo e terra lo ser passado, nehum palavra, nehum lettra de o lei nada ser passado, ate que tudo lo ser cabado. 19 Videaquel, quem seja lo quebra uma de istes mais piquinino manedmentos e assi lo ensina por gentes, (per faze) el lo ser chomado o mais piquinino ne o reyno de ceo; mas, quem seja lo faze e lo ensina istes mandamentos, aquel mesmo pessaõ lo ser chomado grande ne o reyno de ceo. 20 Porque eu te falla por vosoutros, doque _o justiça_ de os escribos e (de os) phariseos, si vossa justiça non ten mais grande, vosoutro si nem hum modo nada entra ne o reyno de ceo. 21 ¶ Vosoutros ja ovi que tinhe fallado de elotros de tempo antigo, (velho tempo) vos nada mata, e quem seja te mata, lo ser ne perigo de o juizo. 22 Mas Eu te falla per vosoutros, que quem seja com sua irmaõ tem raibe sem rezão, lo ser ne perigo de o juizo, e quem seja per sua irmaõ lo falla, Raca, (vil pessaõ,) lo ser ne perigo de o supremo counselho, e quem seja que lo falla vos dodo, lo ser ne perigo de o fogo de inferno. 23 Videaquel, si vos te trize vossa sagoate per o altar, e ali te cahi ne sentido que vossa irmaõ tem alun cousa contra vos. 24 Ali guarda vossa sagoate diante o altar, e anda vos, primeiro com vossa irmaõ fica bom amizade, e depois de aquel, vi, e offerçe (da) vossa sagoate. 25 Accorda com vossa enimigo prestamente que hora vos tem ne o caminho com elle, ou senaõ ne alum tempo, o enimigo pode entrega per vos per julgador, e o julgador te entrega per vos per sapier, e vos te fica lançado ne prisão. 26 Em verdade Eu te falla per vos, que vos nem hum modo nada vi fora (de aquel lugar) ate que vos ja paga o trazeiro padas de dinheiro. 27 Vosoutros ja ovi que tinhe fallado, de elotros de tempo antigo vos nada faze adulterio. 28 Mas, per vosoutros Eu te falla Que quem seja com impuro deseijo te olha sobre hum mulher, ja faze adulterio com ella ne sua coração. 29 E si vossa olha dreito te offende par vos (tem um cassião per vos per offende) ranca aquel, e pincha fora de vos, porque tem mais bom per vos que uma de vossas olhos te fica destruido, e não que vossa enteiro corpo lo ser lançado ne inferno. 30 E si vossa maõ dreito (mesmo modo) te offende per vos, corta aquel, e lança fora de vos, porque doque vossa inteiro corpo per fica lançado ne inferno, tem mais bom que uma de vossa mãos te fica destruido. 31 Tinhe fallado que quemseja lo reda (bote fora) sua mulher, elle miste da per ella hum carta de seperaçaõ. 32 Mas eu te falla per vosoutros que quem seja lo reda sua mulher senaõ (forde) per rezaõ de fornicaçaõ, ella te causo per faze adultero, e quem seja lo caza com aquel mulher, (tambem) te faze adulterio. 33. Torna, vosoutros ja ovi que tinhe fallado de elotros de tempo antigo, vos ne mista da falsa juramento, mas miste paga per o Senhor vossa permita: 34 Mas Eu te falla per vosoutros, que enteiromente ne miste jura nem pelo ceo porque aquel tem o throno de Deus. 35 Nem pelo o terra porque aquel tem o estrado de sua pes: nem pelo Jerusalem porque aquel tem o cidade de o grande Rey. 36 Nem pelo vossa cabeça porque vos nonpode faze branco ou preto hum cabello. 37 Mas vossas cõmmunicaçaõ desse fica sem, sem naõ, naõ, porque doque iste que seja tem mais, te vi de mal. 38 ¶ Vosoutros ja ovi que tinhe fallado, hum olho por hum olho, e hum dente por hum dente. 39 Mas Eu te falla per vosoutros que vosoutros ne miste dessa mal: mas quem seja quando buftea per vos ne façe dreito; vira per elle o outra tambem. 40 E si alum homi lo çita per vos ne hum corte de justiça, e tira vossa cabai, elle desse toma vossa mantle tambem. 41 E quem seja lo força par vos per anda hum leagou, anda com elle dous leagous. 42 Da per elle quem te pedie com vos, e ne miste vira de elle quem lo toma per deuda de vos. 43 Vosoutros ja ovi que tinhe fallado, vos miste ama per vossa vizinho, e abhoreçe per vossa enimigo. 44 Mas Eu te falla per vosoutros. Ama por vossas enimigos, benze per elotros quem te maldiçoa per vosoutros, faze bom per elotros quem te abhoreçe por vosoutros, e roga (com Deos) por elotros, quem te faze mal, e te perseguir per vosoutros. 45 Que vosoutros pode fica o filhos filhas de vossas Pai quem tem ne ceo, porque elle te faze o Sol por luze sobre o maldito gentes, e sobre o bom gentes, e te manda chuve sobre os justos, e (tambem) os injustos. 46 Porque si vosoutros te ama per elotros, quem per vosoutros te ama, vossas meriçementos que tem? O maldito gentes o mesmo te faze. 47 E si vosoutros per vossas irmaõs namais te mostra bondade, vosoutros que te faze mais doque outros? O maldito gentes o mesmo te faze. 48 Videaquel, seja vosoutros perfeito, ate assi como vossas Pai quem tem ne ceo, tem perfeito. Capitulo VI Toma cuidade que vosoutros nunca faze caridade, (da ismolas,) diante de gentes per fica olhado de elotros; ou senaõ vosoutros nunca recebe nem um paga de vossas Pai quem tem ne ceo. 2 Videaquel, vos quando te da ismolas, ne miste son hum trombetta diante de vos, (per da sabe vos que te faze) assi como os hypocritas te faze, ne os synagogas, e ne os ruas que elotros pode acha honra de gentes; Em verdade, eu te falla per vosoutros, (Que) elotros te acha elotros su paga. 3 Mas vos quando te da ismolas, vossa maõ escarde naõ desse sabe, vossa maõ dreito que te faze. 4 Que vossas ismolas pode ser ne segrade, e vossa Pai, quem ne segrade te olha, sua mesmo ne publico lo paga per vos. 5 ¶ (E tambem) vos quando te ora (te roga com Deus) ne miste fica mesmo per os hypocritas porque elotros te dizer per ora ne os synagogas, e cantos de ruas, que elotros pode ser olhado de gente. Em verdade eu te falla per vosoutros que elotros te reçebe elotros su paga. 6 Mas vos, quando vos te ora, entra ne vossa cambre, e quando vos ja ficha porta, ora com vossa Pai quem tem ne segrade e elle quem te olha ne segrade ne publico lo paga par vos. 7 Mas vos outros quando te ora, naõ usa vaõ palavras, assi como os gentios te faze, porque elotros te lembra que elotros lo tem ovido per rezaõ de elotros su muito palavras. 8 Videaquel vosoutros ne miste fica mesmo per elotros, porque vossas Pai (celestial) enteiromente te sabe vosoutros que cousas te mista ansque vosoutros te pedie de elle. 9 Videaquel, ne iste modo vosoutros miste roga. Pai nossa quem tem ne ceo, sentificado seja tua nome. 10 Venho o tua reyno, seja feito a tua vontade asis ne terra como ne ceo. 11 O paõ nossa de cada dia nos da hoje, 12 E perdoa nos nossas dividas, assi como nos te perdoa per nossos dividores. 13 E nos naõ desse cahi ne tentaçaõ, mas livra nos de mal, porque teu tem o reyno e o poder, e o gloria, pera tudo sempre, Amen. 14 Porque, si vosoutros te perdoa per gente elotros su offenças, vossas Pai celestial tambem lo perdoa per vosoutros. 15 Mas si vosoutros per gente nunca perdoa elotros su offenças, vossas Pai celestial tambem nada perdoa (per vosoutros) vossas offenças. 16 ¶ Torna, vosoutros quando te jingua, noõ fica mesmo per o hypocritas, com hum rosto de tristeza, porque elotros te faze feu elotros su rostas, que pode parçe per gente que elotros te jingua. Em verdade eu te falla per vosoutros (que) elotros te reçebe elotros su paga. 17 Mas vos, quando vos te jingua, onta (com azete) vossa cabeça e lava vossa rosta. 18 Que per gente naõ pode parçe que vos te jingua, mas per vossas Pai, quem ne segrade te olha, e vossas Pai quem ne segrade te olha, ne publico lo paga par vos. 19 ¶ Vosoutros nemiste junta thesouros (riquezas) ne o terra, onde pouches e forea te dana, e onde ladraõs te entra e te furta. 20 Mas junta per vossa mesmos, thesouros ne ceo, onde nem pouche nem forea nunca dana, e onde ladraõs nunca entra e furta. 21 Porque vossas thêsouro onde tem, ne aquel lugar tambem vossas coraçaõs lo fica. 23 O lumi de o corpo tem o olho, videaquel si vossa olho tem puro (sinçero,) vossa inteiro corpo lo tem enchido de lumi. 23 Mas si vossa olho tem mal, vossa inteiro corpo lo tem enchido de escuridade, videaquel si o lumi que tem dentro de vos tem escuridade que grande tem aquel escuridade! 24 ¶ Nem hum homi nonpode servi per dous Senhors, porque elle lo abhoreçe per huma, e por outra hum lo ama, ou senaõ, elle lo tem firme per huma, e por outra hum lo disimporta, vosoutros nonpode servi per Deos, e tambem per Mammon (ou requezas). 25 Videaquel Eu te falla por vosoutros naõ toma nem hum cuidade toquando de vossas vida, vosoutros que lo comer, ou vosoutros que lo bebe, nem toquando de vossas corpo, vosoutros com que lo tem vestido, doque comer, nontem o vida de valia mais grande, e (tambem,) o corpo do que vestidos? 26 Olha os pastros de ar! porque aquelles nunca bruffa, nem nunca faze novidade, nem nunca junta ne celleiros, ainda, vossas Pai celestial te sustenta per aquelles, (e) doque aquelles nontem vosoutros muito mais bom? 27 Com muito lembranças quem de vosoutros pode faze sua mesmo hum covido mais alto? 28 E porque vosoutros te cuida toquando vestidos? considera os fules de o campo, (varze,) aquelles ne que modo te cresçenta, aquelles nunca servi, nem nunca travai. 29 E ainda, Eu te falla per vosoutros, que ate Salomão ne tudo sua gloria (grandeza) non tinhe vestido assi (bunito) como huma de istes (fules). 30 Videaquel si Deos assi te vesti os fules de o campo, que hoje te fica, e amiam tem lançado ne forno (ou fogo,) Nontem sua vontade muito mais pera vesti per vosoutros? O vosoutros de bem pouco fe! 31 Videaquel, non toma cuidade fallando, nos que lo comer, ou nos que lo bebe? ou nos com que lo tem vestido? 32 (Porque tudo de istes cousas os Gentios te busca,) porque vossas Pai celestial (bemfeito) te sabe que vosoutros tem necessidade de istes cousas. 33 Mas, primeiro vosoutros miste busca o reyno de Deos, e sua justiça e (aquelhora) tudo de istes cousas per vosoutras lo ser dado. 34 Videaquel naõ toma nem hum cuidade toquando de amiam, porque o amiam lo toma cuidade toquando os cousas que per aquel te compete. Per cada hum dia o mal tem baste, que te compete per aquel dia. Capitulo VII Nao julga, que vosoutros nunca ser julgado. 2 Porque com que julgaçaõ vosoutros te julga (per gente) vosoutros (tambem,) lo ser julgado (de Deos,) e com que medida vosoutros te medi, aquel mesmo per vosoutros lo ser medido torna. 3 E porque vos te olha o mote (piquinino erro) que tem ne olho de vossa irmão, e nunca considera a grande faltançe que tem ne vossa mesmo olho? 4 Ou quely vos lo falla per vossa irmaõ, Eu desse tira o mote fora de vossa olho; e Olha! hum grande faltançe tem ne vossa mesmo olho? 5 Vos hypocrita! primeiro, fora de vossa mesmo olho, pincha aquel grande faltançe e aquelhora, mais claromente vos lo olha per tira o mote fora de vossa irmão su olho: 6 ¶ Aquel que tem santo, naõ da per os cachors nem pincha vossas aljoffries diante os porcas, ou senão (istes bom cousas) aquelles (porcas e cachors) lo massa baixo de pe; e torna lo vira, e lo rompa per vosoutros. 7 Pedie (com Deos) e aquel lo ser dado per vosoutros, busca, e vosoutros lo asserta, bate, (per o porta de misericordia,) e per vosoutros aquel lo ser aberto. 8 Porque cada hum pessaõ quem te pedie (ne dreito modo,) te recebe, e elle quem te busca, te asserta, e per elle quem te bate o porta lo ser aberto. 9 Ou, entre de vosoutros, qui homi tem, quem per sua filho lo da hum pedra, elle quando te pedie pão? 10 Ou, si elle te pedie hum peixe, elle lo da hum serpente. 11 Antos, si vosoutros, tendo mal, te sabe perda per vossas filhos bom cousas, que tanto mais vossas Pai quem tem ne ceo lo da bom cousas per elotros quem te pedie de elle. 12 Videaquel tudos cousas que seja que vosoutros te querre que gente per vosoutros miste faze, o mesmo (cousas,) vosoutros miste faze per elotros, porque iste tem (o mandemento,) de o lei, e de o prophetas. 13 ¶ Entra vosoutros ne o porta estreito, porque largo tem o porta, e largo tem o caminho que te leva per destruição, e bastantos tem quem ne aquel te alcança. 14 Videque estreito tem o porta, e estreito o caminho que te leva per vida, e poucos namais, aquel te asserta. 15 Toma cuidade de falso prophetas, quem per vosoutros te vi, ne vestidos de ovelhas (de enganho,) mas dentro, elotrem tem bem maldito. 16 Vosoutros lo conheçe per elotros, de elotros su frute, gente te panha ouves de espinhos? ou bom fruite de mal albris? 17 Ate assi, cada hum bom albri te produçe bom fruite, mas hum mal albri mal fruite nenhum mal albri nonpode produçe fruite bom. 18 Hum bom albri non pode produçe mal fruite, nem, hum albri corrupto non pode produçe bom fruite. 19 Cada hum albri, que nunca produçe bom fruite tem cortado e pinchado ne o fogo. 20 Videaquel de elotros su fruite, vosoutros lo conhece per elotros. 21 Naõ cada um pessaõ quem par me te falla Senhor! Senhor! nada entra ne o reyno de ceo, mas elle (namais,) quem te faze o vontade de meu Pai quem tem ne ceo. 22 Bastanto (pessaõs) lo falla par mi, ne aquel dia (de julgaçaõ,) Senhor, Senhor, nos nunca prophecia ne tua nome? e ne tua nome ja lança fora diabos? e ne tua nome ja faze bastantos obras espantoso? 23 E aquelhora, per elotros Eu lo declara, Eu nem hum tempo nunca conheçe, per vosoutros, sahi de mi, vosoutros quem te faze iniquidade! 24 ¶ Videaquel, quem seja te ovi istes meu ensinos, e aquelles te faze, Eu lo papia de elle assi como de hum homi sizo, quem je concerta sua caza riba de hum rocha (muito grande e força pedra). 25 E o chuve ja cahi, e os aguas, ja vi e os ventos ja abala, e ja bate sobre aquel caza, e aquel nunca cahi, per o causo que aquel tinhe fundado riba de um rocha. 26 E cada hum pessaõ quem te ovi istes meu ensinos e aquelles nunca faze, toquanto de elle eu lo papia assi como hum homi dodiçe, quem sua caza ja concerta riba do area. 27 E o chuve ja cahi, e os aguas ja vi, e os ventos ja abala, e ja bate sobre aquel caza, e aquel ja cahi e grande tinhe o ruido de aquel. 28 E aquel ja vi per suste, Jesus quando ja caba istes ensinos, que os gentes tinhe espantado com sua doutrino. 29 Porque Jesus ja ensina per elotros assi como huma quem tinhe com authoridade (poder) e não assi como os escribos. 7. O dialecto portuguez de Malaca John Cameron, que viajou na India ha vinte e tantos annos, descrevendo na sua obra _Our tropical possessions in Malayan India_ (London, 1865, pag. 374[5]) os descendentes dos portuguezes estabelecidos em Malaca, os quaes são uma raça mixta de portuguezes e indigenas, nota que durante um periodo de cerca de dois seculos elles têem conservado a sua lingua original e continuam a fallar uma especie de portuguez corrupto (_broken portuguese_); que elles são grandes musicos, que são muito prolificos, e que ao caír da tarde os homens casados se assentam nas varandas de suas casas dando para a rua, tocando geralmente no violino alguma melancholica melodia para divertimento de suas mulheres e familias que estão reunidas em roda d'elles. 8. Dialecto macaista D'este só conhecemos o que nos ministram as duas cartas que reproduzimos; a primeira foi publicada em 1865 no _Ta-Ssi-Yang-Kuo_, jornal de Macau, e reproduzida na _Gazeta de Portugal_; a segunda te-mol-a n'uma folha avulsa, tiragem á parte de um jornal provavelmente o mesmo _Ta-Ssi-Yang-Kuo_. As cartas foram forjadas por quem conhecia a lingua litteraria; um documento verdadeiramente popular falta-nos infelizmente. Não ha n'esse dialecto distincção de generos; o _P. S._ da primeira carta indica que a influencia do jornalismo ía introduzindo as fórmas, da lingua mãe. O plural é expresso pela repetição da palavra: _china china_, os chinas; _criança criança_, crianças; _sium sium_, senhores; _amigo amigo_, amigos. As fórmas verbaes estão reduzidas a uma, que é o infinito geralmente, ou uma fórma do presente, a qual póde ser empregada como infinito; assim _calote de vae pescar_, tolice de ir pescar; _hora de vem_, hora de vir; _pôde tem_, póde ter. A mesma fórma serve para todas as pessoas. O _r_ do infinito foi apocopado excepto no verbo _ser_: _tirá_, tirar; _mandá_, mandar; _fazê_, fazer; _coré_, correr; _subí_, subir. O presente é expresso: 1) pelo infinito: _vosso tio gostá_, vosso tio gosta; 2) por uma fórma do presente: _china sam tolo_, o china é tolo; 3) por _tá_ (está) com o infinito: _tá fazê_, faço, fazes, faz, etc., _tá andá_, ando etc., _tá fallá_, fallo, etc.; 4) por _tá_ (está) com a fórma do presente que toma o logar do infinito: _tá vai_, vou vae, etc. O futuro é expresso por _logo_ com o infinito: _logo ficá_, ficará; mas n'alguns casos esse processo serve para exprimir o presente. O passado é expresso: 1) pela formula fundamental: _augmentá_, augmentou; 2) por _já_ com a fórma fundamental: _já principiá_, principiou; mas este processo parece tambem exprimir o presente. Conservam-se os participios passivos: _impurado_, _costumado_, etc. Notem-se, entre outras, as seguintes fórmas: _mestê_, ser preciso, de ver; _promódi_, por amor de, porque; _pastro_, passaro; _assilai_, tal. *Carta de Siára Pancha a Nhim Miquela* Macáo _3 de janero de 1865_. «Minha querida Miquéla. Tanto tempo eu já querê respondê vosso carta, mas sempre sentî doente, porisso tanto tardá este resposta. Vôs minha Miquéla nadi ficá reva cô eu; vôs sabe qui eu mutu querê pra vôs, e se nunca escrevê mas ásinha san prómódi já tá múto véla. Otro dia acun-ha mofina di ama abri janella, eu irguí cedo, sai fóra, apanhã vento, ficá constipada. Priméro toma sincap, misinha de vento, raspá mordicim, mas nunca pôde ficá bom, cada dia sintí corpo más fraco, perna azedo. Dôtôr falá sam doença d'idade, mas eu nunca sintí assim, chomá mêstre Ahoi, qui tudu gente falá sam capaz, elle já curá. Agora sentí um poco forte, mas mêstre nômquêro que eu fazê mutu força, e mandá tomá ninho di pastro. Nosso Macáo, minha Miquéla tem grande novidade. Governo nôvo sam capaz e já virá tudo. Mas um pôco tempo tudo lôgo ficá virado. Rua agora já nomtêm pedra pedra, sam otro lai môdo, fazê duro cô téra. Fazê gosto olá di bonito. Pra vanda de mar, na praia grandi, já botá qui tanto arvi; tudo gente cioso e intrimittido falá numpresta, qui sabe qui foi, mas eu nunca sintí assim. Campo de Sam Francisco já fichá, fazê jardim, escada grande já nomtêm, fazê ali muro; ali riba, aquelle calvario tamêm tá vai iá pra fazê quartel di soldado, qui já principiá, logo ficá grandi. Porta di Campo e di Santo Antone já nomtêm tamêm, agora sam rua largu, tudo aquelle arvi fronte di Gularte sua casa já cortá, china china falá corê sangui, mas eu sentí china sam tôlo. Aquelle porcaria di fonti perto di cano real tamêm já tapá, abri poço alá vanda. Tudu poço agora tem sua cobertor bem fêto, e bomba di novo invençám. Si minha Miquéla agora pôde ólá tudo aquelle lugar, certo nadi crê qui sam Macáo. Santo Antone qui bem fêto! Aquelle bariga di adro já vai dentro, ficá bonito, e rua mas um pôco grandi. Padri nunca contente, mas qui cuza logo fazê! A nôte já nômtem aquelle escuridám costumado, hoze candía tem tres bico, e china china si querê furtá azète vai cartá mati. Genti di Senado sempre durmido, nomtêm aquelle genio di Governo, que tem ôlo vivo, e nadi iscapá nada. Cêdo, cêdo, já tem na rua, tirá telhêro di botica, rancá pagôde di porta di china china, cortá rua fazê drêto, qui fazê gosto ólá. Otro dia Voluntario inglez d'Hongkong já vem Macáo! Qui lai di bonito! eu já vai ólá tamêm. Macáo parêce França, tudo gente fallá. Tem tifin, rivista di tropa, salva di vinte un-ha tiro, balsa á note qui bonito, gastá cô tudo aquelle flamancia tres mil fóra pataca. Algum gente qui nunca gostá assilai cuza, já vai ólá cova de Sam Francisco Xavier eu tamêm muto quere pra santo, mas nunca vai. Agora tá gavartá Sam Paulo; achá un-ha buracu na Monte, ôtro na frontipicio di igreja e gente antigo fallá sam caminho di basso di téra qui vai di igreja pra fortaleza na tempo de paulista, porisso agora gavartá tudo aquelle mato, pra descobri caminho. Tudu gente fallá ali tem tanto pataca qui jisuita interá, eu achá graça: pôde crê? Padri padri qui cusa pôde tem? coitado! Eu sintí sam historia. Mesmo caminho, qui sabe? Elôtro qui cuza fazê cô caminho basso di téra? Elôtro nunca sam heregi como pedrêro livre, qui cusa fazê di lugar pra escondê? Minha Miquéla nomêstê esquecê di mandá nova di tudu qui ólá ali; si marido tem vagar mandá tamêm escrevê. Gente tá fallá qui moda di balám já cavá pra nhonhonha, eu sintí qui si sam assim sam fortuna. Eu tamêm nompôde gostá di assilai cusa; quando vento grandi sam mutu pirigoso, e quando incustá na janéla, ou ficá capido, impurado pra traz, frôvê sangui ólá. Dá bença pra criança criança e nomêstê esquecê de tudu aquelle receta qui eu já mandá quando apanhá saván. Nomêstê lembrá sam brinco, eu fallá cô experiencia: tudu gente ri, qui foi eu pilá costa a note intêro, mas eu inda tá vivo, elôtro tudu qui fazê cusa de moda tá morê mas ásinha. Eu já mandá dos amchôm di achar di gamên, un-ha balsa di sucri pedra, dos jara di jagra para vós e criança criança, mas nunca achá resposta, porisso eu ficá cô pençám. Já intrá anno novo; mutu bom anno, filicidade, vida, saude para vôs, vosso marido e tudo criança criança. Nosso senhôr deçá criá. Eu tá muto lembrá pra vós, querê mandá um pôco de alúa mas nômpôde, paciencia. Masqui nompôde acetá bom vontade d'este vella chacha qui mutu querê pra vôs. Dá lembrança pra Pepe, falá cô elle múto contente eu já ficá, ouvi falá, elle já ficá bom de espinhéla. Vosso tio padri tamêm mandá lembrança, elle coitado nunca sam nada já. Nhum Quimquim já vai viazi, imbarcá de piloto na navio que levá chuchai, ganhá tanto pataca. Vosso chacha _Pancha._ P. S.--Vós lôgo sintí grandi differença na minha modo di escrevê. Eu já aperfeçoá bastante neste um pôco tempo. Tudu este escóla novo de machu e femia, e aquelle gazetta _Ta-ssi-yang-kuo_ já fazê indretá bastante nosso lingu. *Carta de tia Paschoela á sua sobrinha Florencia* Macáo, 5 de otubro de 1869. Minha Querida Chencha. Como vôs lôgo querê sabe tudo novidade de Macáo, porisso que eu já pedi com tudo sium sium, parecero de jogo, pra trazê tudo novidade de fóra pra eu pôde escrevê pra vôs. Macáo agora já tá muto mudado; já nontêm inveja de Éropa. Pra tudo rua são careta, são cavalo; de tanto que já tem, que já nontêm lugar pra guardá; maior parte ficá pinchado na meu de rua de S. Lorenço. Agora tá fazè ung-a casa qui lai de grande na horta de governador, tamem pra guardá careta e cavalo. Olá um pôco, minha Chencha, fazê palacio na cidade pra cavalo, tudo pobre pobre vae pará pra casinha de campo! Agora tá com força de prepará pra recebe principe de Inglaterra. Já pedi com sium Carlito pra dá moda pra fazê ung-a cadera pra cartá principe. Querê cadera que tem quatro pinga pra oito cule; mas como vosso tio gostá muto de figurá, já lembrá de pedí pra convidá oito comendador pra cartá aquelle bemaventurado principe, pra vosso tio tamem pôde entrá na meu. Nosso governador lôgo vae ficá na casa vasio de sium Lorenço pra dá palacio pra principe. Nosso juiz tá perto vae já pra Goa. Coitado de vêlo, já soffrê ung-a molestia bem de grande que escapá morê. Agora tá andá côtê; assim mesmo este um pôco de farizêo nunca perdoá de desesperá aquelle pobre vêlo, que se nunca são cuidado de Padre Maximo, com sua misinha cazera, já vae já pra otro mundo! Já cavá lua de batê páu, mas lua de batê costa de china china inda nompôde cavá, porisso que este um pôco desabrogunhado rabo de porco cada vez tá mas atrevido. Otro dia eu já assistí festa de Senhora Rozario. Sentí na greza ung-a chêro bem desagradavel. Vem casa a note, tá contá com tio João, elle então que dá conta, que já levantá um pôco alto parte trazero de capela-môr; já fazê ali ung-a lugar pra botá imundicia. Quando vem chua, tudo agu de aquelle porcaria porcaria, contaminá pra pê de parede, vem pra dentro de capela-môr. Vôs inda lôgo ovi, minha Chencha, que algum dia inda lôgo mudá tudo cavalo de policia pra dentro de greza, pra tem mas cham pra fazê palacio grande grande pra official. Agora já nunca contentá cada ung-a com dos cela. Cada official querê sete cela, qui lai môdo pôde chegá? Padre Rondina já livrá de ung-a desgraça qui lai de grande! Que sabe qualo mapeçoso aquelle que já vae tirá de sua lugar ung-a botle de enxarope, bota ung-a botle de verniz. Coitado de padre, sem sabe de nada, virá muto socegado na sua botle pra copo de agu; quando bebê primero pucado, então que sentí que são verniz! Nunçám obra de maliçombrado! querê vernizá tripa de gente como vernizá cadera, canapé?! Vosso tio tá muto triste. Este anno já perdê quanto mil pataca com laia laia de condenação de historia. Se o menos pôde tem agora grande negocio de cule, tamem são bom; pôde chubi um pochinho de aqui, um pochinho de ali, discontá o que já perdê. Jogo este anno já nompôde tirá muto. Dispeza cada vez mas grande. Familia augmentá. Divida nompôde cobrá; maior parte são gente grande grande que tá devê. Assim mesmo, minha Querida Chencha, inda nompôde quexá de falta que comê; perna de presunto que china china mandá de presente, armado de ung-a ponta pra otro ponta de cusinha; mas vosso tio nompôde comê ôtro cusa mas que pece fino, chilimeçô de casa algum vez lamci di Cantão. N'otro tempo pescaria são na agu salgado; agora são na agu doce. Que sabe qualo bragero aquelle que já inventá que na Praia Grande tem pescaria de pece pedra, aquelle rapaz de botica de Neves já cae na calote de vae pescá anote fronte de sua botica. Pinchá linha cae na sêco; em quanto tá safá linha, senti comedura; quando puça, apanhá ung-a casta de susto qui laia de grande! era que são ung-a cuzaçuso de rato, como ung-a letão, ganchado na anzol. Aquelle tentação de animal principiá côrê pra tudo Praia Grande com linha na boca, e pobre de rapaz a côrê traz de tal rato pra salvá sua linha; de sorte que já fazê ri tudo aquelle gente na Praia Grande com tal pescaria de pece pedra, que ramatá, largá sarangong. Manjor Julio já tem quanto mez já de morto. Aquelle tolo de Boletim parte que dá peza sua viuva, vae dá pra tudo sua amigo amigo. Que sabe se na Éropa são costumado assim? Tudo vez que eu sae na janella intopá com ung-a official de vapor que casta de-chistoso, mas historero, sevandizio que más nompôde ser. Tem ung-a nome que laia de galante; eu já nompôde lembra se são Homecaco o Monocaco, mas são ung-a cusa assim de caco. Máu genio, lingustero, intremetido, até querê intremetê com emprego de sium Miguel Simões, e tá fazê conta já de intrá naquelle lugar. Pra tudo gente são meçá chavoqueada, tirá dente, tira lingu; mas medrozo como cachoro china. Como já são hora de vem tudo parecero de jogo, eu já nompôde escrevê mas novidade. Amestê olá fazê chá, tirá sucre, mandá fazê torada, comprá manteguilha na botica de barbero. Adeus, Minha Querida Chencha, Deus conservá saude pra vos e pro vosso Abelardo, Eu, vosso tio, tia tia, tio João, tudo mandá muto lembrança. Vai ung-a botle de achar laia laia e ung-a flandi de bolo batê-pau torado. Vosso tia e amiga _Pascoela._ 9. Appendix: O portuguez alterado como o fallam os negros e os estrangeiros que possuem mal a lingua tem sido muitas vezes imitado, principalmente no theatro e na litteratura de cordel. Apesar do interesse secundario d'essas imitações damos, alguns specimens. (_Indo Gonçalo seu caminho, apartando-se do Clerigo, topa hum Negro grande ladrão, e entra cantando buscando hum mulato: e diz Gonçalo, depois de cantar o Negro:_) GONÇ. Dize, negro, es da côrte? NEG. Qu'esso? GONÇ. S'es da côrte? NEG. Ja a mi forro, nam sa cativo. Boso conhece Maracote? Corregidor Tibão he, Elle comprai mi primeiro; Quando já paga a rinheiro, Daita a mi fero na pé. He masa tredora aquelle, Aramá que te ero Maracote. GONÇ. Mais tredor era o rascote Que m'a mim furtou a lebre. NEG. Qu'he quesso que te furtai? GONÇ. H[~u]a lebre de meu pae, De meu cunhado huns capões, E marmelos e limões; Abonda tudo lá vai. NEG. Jesu, Jesu, Deoso consabrado! Aramá tanta ladrão! Jesu! Jesu! hum caralasão: Furunando sá sapantado. Jesu! cralasam. Pato nosso santo paceto ranho tu e figo valente tu e cinco sego, salva tera pão nosso quanto dão dá noves caro he debrite noses ja libro nosso gallo. Amen Jeju, Jeju, Jeju. Sa pantaro Furunando. Dize, rogo-te, fallai: Conhece tu que furtai? Porque tu nam bruguntando? GONÇ. Perguntarei por meu pae. NEG. Cal-te: Deoso cima sai, Que furtai ere oiai. Deoso nunca vai dormi, Sempre abre oio assi, Tamanha tu sapantai. Guarda mar esso mal, E senhora Prito santo. Nunca rirá homem branco Furunando furta real. Não sabe mi essa careira: Para que? para comê? Muto comê muto bebê Turo turo sa canseira. Vira mundo turo canseira: Senhor grande, canseira; Home prove, canseira; Muiere fermoso, canseira; Muiere feio, canseira; Negro cativo, canseira; Senhoro de negro, canseira; Vai missa, canseira; Prégação longo, canseira; Crerigo nam tem muiere, canseira; Crerigo tem muiere, canseira; Grande canseira: Firalgo sôlto, canseira; Chovere muto, canseira; Não póde chovere, canseira: Muito filho, canseira; Nunca pariro canseira; Papa na Roma canseira; Essa ratinho, canseira; Não vamo paraiso, grande canseira; Vira reza mundo turo turo he Canseira. Mi nam falla zombaria. Pos para que furtai? Que riabo sempreza! Abre oio turo ria. Mi busca mulato bai. Ficar abora, ratinho. GONÇ. Eu aguardo meu padrinho, Que va comigo a meu pae. Eu vou ao rio perem, Porque hei sêde e beberei, E sicais que nadarei Emquanto o clerigo vem. Leixarei o chapeirão Mettido nesta mouteira, E o cinto e esmoleira, Porque lá logo o verão, Não me aqueça outra tal feira. (_Espreita o negro como Gonçalo esconde o chapeirão e o al, e tanto que se vai entra dizendo:_) NEG. A mi abre oio e ve Ratinho tira besiro: Ere dexa aqui condiro: Não sei onde elle mettê. Senhora Santo Francico, Santa Antonia, San Furunando! Pois mi ha d'andar buscando, E levare elle na bico O servo Santa Maria. Sabe a regina Matho misercoroda nutra d'hum cego savel até que vamos. A oxulo filho d'egoa alto soso peamos ja mentes ja frentes vinagre qu'elle quebrárão em balde ja ergo a quante nossa ha ilhos tue busca cordas oculos nosso convento e geju com muito fruta ventre tu ja tremes ja pias. Seuro santa Maria dinhero me lá darão he ve esa carta da me mucho que furte cantara Furunando. (_Acabada assim esta_ salve regina, _acha o Negro o que Gonçalo leixou escondido, e diz:_) Ei-lo aqui sa! Deoso graça. Graça Deoso esse he capote; Nunca dexa aqui palote: Ratinho, quem te forcasse! Aramá que te ero villão! Que palote saba sam, Barete também bo era. Mi cansai e á deradera A mior fica sua mão. Vejamos bolsa que tem: Hum pente para que bo? Tres ceitil sa qui so: Ratinho nunca bitem. O riabo ladarão! Corpo re reos consabrado! Essa villão murgurado Sa masa prove que cão. Quando bolsa mi achase Fernão d'Alvaro, esse si; Nunca pente sa alli. Ah reos! quem te furtasse Bolsa, Nuna Ribeiro! Home bai busca rinheiro: A toro ere rise: Ja rinheiro feito he. Aramá que tu ero gaiteiro! Fernão d'Alvaro m'acontenta; Elle nunca risse nam. Logo chama ca crivam, --Crivaninhae esormenta; Toma rinheiro, vas embora. Boso, home de bem, que buscae? --Mi da cureiro agarba sae. --Boso que buscai corte agora? --Buscae a Rei jam João, Paga minha casaramento. --Dá ca, moso, trae esormento; Crivaninhae boso, crivão: Home, tomae hum dos quatro sete: Vas embora turo turo. Sua rinheiro sa segura, Mioro que elle promete. Marco Estevez moladeiro. Elle rise: Santa Maria! Rinheiro boso queria? Bai bai dormir paieiro.-- Boso que pedir, muieiro? --Tanta filho mi tem qui... --Quem manda boso pari, Boso grande parideiro? --Boso seria muito bô: Vaca ne Francico paia; Tenha seis filho e mi so Nam temo comere ni migaia. Elle rise: Que culpo tem a Rei jam João Boso parir como porco, Bai buscai sua pae torto, Que dai a sua fio pão. Velha, que boso querê? --Molla, que a mi pobre sai. Elle rise: Porque boso nan guardai Rinheiro que boso bebê?-- Jesu! Jesu! moladeiro Sa riabo aquella home: Quando a mi more da fome Nunca buscai sua rinheiro, Porém graça a Reos, a mi Nunca minga que furtá; Pouco ca, pouco relá, Pouco requi, pouco reli, Grão e grão gallo fartá, Quem furta, home sesuro: E louvar a Reos com turo E senhoro Prito Santo. A mi bai furta emtanto Camisa que sá na muro. Gil Vicente, O Clerigo da Beira. _O preto, e o bugio ambos no mato discorrendo sobre a arte de ter dinheiro sem ir ao Brazil._ Lisboa. Na officina patriarchal de Francisco Luiz Ameno 1789. 4.^o 21 pp.--Excerpto: «Já non pore deixá de incricá os cabeça, e confessá, que vozo doutrina sá huns doutrina tão craro, e verdadeiro, que pla mim sá huns admiraçom non sé platicada per toro o mundo. O trabaio a que vozo obliga os pleto, e os blanco; sá huns trabaio a que ninguem se pore negá sem melecé huns cóssa bom; porque os genia, e os incrinaçom do natureza a toro gente move pala ere, e fóla de trabaio ninguem pore vivé em satisfaçom. Mim agola sem trabaiá nom pore conté, ainda que mim ter abominaçon a captiveiro cruere de blanco, de que sá forro; com turo non aglada a mim estar aqui sem nada fazé: evita vozo tanta plegiça, os excessa de plodigo, e dos varento, que nozo poderemo toro assi havé os oira, e triunfá dos indigencia; e de turo quanto pore infelicitá. Se aqui apalecera agola uns blanco, que pole escrevé os mavioso doutrina, que vozo platicá, e toro o gente ouvire cos oreia aberto, faria ere ao familia toro do mundo hum favoro, que meoro non pore imaginá.» p. 21. II. DIALECTOS HESPANHOES 1. Creolo de Curaçáo Esta ilha, cujo nome é lembrado por um licor bem conhecido, que d'ella tomou o seu, é uma das tres ilhas denominadas de «sotavento»; está situada em frente da costa de Venezuela entre a lat. 12° 3' e 12° 24' e long. 68° 47' e 69° 16' Gr. Com as outras ilhas do grupo pertenceu á Hespanha depois de seu desenvolvimento até 1648 em que a Hollanda ficou de posse d'ella, e conservando-a até hoje, apenas com uma interrupção produzida pelo dominio de Inglaterra de 1807 até 1815. A primitiva colonisação hespanhola foi muito limitada. Hoje a população da ilha sobe a mais de 15:000 habitantes, de que apenas cêrca de um quinto são brancos. A população negra parece ter passado para lá em grande parte das colonias hespanholas; o dialecto creolo que ella falla tem por base o hespanhol e contém alguns elementos lexiologicos ministrados pelo hollandez. O sign. E. Teza consagrou a esse dialecto um artigo no _Politecnico_, vol. XXI, p. 342-352, tendo por base de investigação o livro: _Catecismo pa uso di catolicanan di Curaçao. Cathecismus ten gebruike der katholyken van Curaçao door Martinus Joannes Niewindt, bissehop van Cytrum, karmerheer van Z. H. en apostolisch vicarius van Curaçao. Gedrukt te Curaçao ter drukkery van zyne doorluchtige hoogwardigheid_. Segundo o illustre professor italiano esse catechismo não foi impresso muito antes de 1845. _The Bible of Every Land_, p. 270, dá-nos a seguinte noticia: «Uma traducção de parte do Novo Testamento n'esta lingua foi feita pelo rev. Mr. Conradi; e uma pequena edição do evangelho de S. Matheus foi impressa em 1846, a expensas da Sociedade biblica neerlandeza». O sign. Teza não soube da existencia d'essa traducção, de que a obra ingleza citada nos dá um specimen em orthographia hollandeza, que vamos reproduzir enterlinhando-o com as palavras hespanholas correspondentes, tanto quanto conseguimos determinal-as. *S. Matheus, cap. V v. t. 12* 1. _Anto ora koe Hezoes a mira toer e heende nan eel a soebi_ Entonces hora que Jeus ha mirar todo el hombre--el a subir _o en seroe; deespues eel a sienta i soe desipel nan a bini_ a un sierra; despues el a sentado y su discipulo--ha venido _seka dje._ cerca del. 2. _I eel a koemisa di papia i di sienja nan di ees manera._ Y el ha comenzar de papiar y de enseñar -- de esta manera. 3. _Bieenabeentoera ta e pober nan na spiritoe, pasoba reina_ Bienaventurado está el pobre -- spíritu, por-este-obra reino _di Dioos ta di nan._ de Dios está de-- 4. _Bieenabeentoera ta ees nan, koe ta jora pasoba lo_ Bienaventurado está este --, que está llorar, por-este-obra-- _nan bira konsolaa._ -- consolado. 5. _Bieenabeentoera pasifiko nan, pasoba lo nan erf tera._ Bienaventurado pacifico --, por-este-obra -- -- tierra. 6. _Bieenabeentoera ees nan, koe tien hamber i sedoe di hoestisij,_ Bienaventurado este --, que tiene hambre y sed de justicia, _passoba lo nan no tiene hamber i sedoe mas._ por-este-obra -- -- no tiene hambre y sed mas. 7. _Bieenabeentoera ees nan, koe tien mizerikoordia, pasoba_ Bienaventurado este --, que tiene misericordia, por-este-obra _lo heende tien mizerikoordia koe nan,_ -- hombre tiene misericordia con -- 8. _Bieenabeentoera ees nan, koe ta liempi di koerasoon, pasoba_ Bienaventurado este -- que está limpio di coraçon, por-este-obra _lo nan mira Dios._ -- -- mira Dios, 9. _Bieenabeentoera ees nan, koe ta perkoera paas, pasoba_ Bienaventurado este --, que está procurar paz, por-este-obra _lo nan ta jama joe di Dioos._ -- -- está llamado hijo de Dios. 10. _Bieenabeentoera ees nan, koe ta persigido pa motiboe di_ Bienaventurado este --, que está persiguido por motivo de _hoestisji, pasoba reina di Dioos ta di nan._ justicia, por-este-obra reino de Dios está de --. 11. _Bosonam lo ta bieenabeentoerado koe ta koos nan zoendra_ Vosotro-_nan_ -- está bienaventurado que está -- -- -- _i persigi bosonan, i koe ta koos pa mi kausa nan ganja_ y persiguido vosotro-_nan_, y que está -- por mi causa -- gañar _toer soorto di maloe ariba bosonan._ todo suerte de malo arriba vosotro-_nan_. 12. _Legra bosonan i salta di legria, pasoba bosonan_ Alegrar vosotro-_nan_ y saltar de alegria por-este-obra vosotro-_nan_ _rekompeensa ta grandi deen di Ciëloe; pasoba nan a persigi_ recompensa está grande dentro de Cielo; por-este-obra -- ha perseguido _di ees manera e profeet nan, koe tabata promee koe bosonan._ de este manera el profeta --, que estaba primero que vosotro-_nan_. Para auxiliar a comprehensão d'esse excerpto damos a versão hespanhola dos doze versiculos de S. Matheus. 1. Mas viendo Jesus este gentío, se subio á un monte, donde habiéndose sentado, se le acercaron sus discípulos; 2. Y abriendo su boca, los adoctrinaba diciendo: 3. Bienaventurados los pobres de espíritu, porque de ellos es el reino de los cielos. 4. Bienaventurados los que lloran, porque ellos serán consolados. 5. Bienaventurados los mansos, porque elles poseerán la tierra. 6. Bienaventurados los que tienen hambre y sed de justicia, porque ellos serán saciados. 7. Bienaventurados los misericordiosos, porque ellos alcanzarán misericordia. 8. Bienaventurados los limpios de corazon, porque ellos verán á Dios. 9. Bienaventurados los pacificadores, porque ellos serán llamados hijos de Dios. 10. Bienaventurados los que padecen persecucion por la justicia, porque de ellos es el reino de los cielos. 11. Bienaventurados sereis cuando los hombres per mi causa os maldijeren, y os persiguieren; y dijeren con mentira toda suerte de mal contra vosotros. 12. Alegráos y regocijáos, porque es muy grande vuestra recompensa en los cielos: del mismo modo persiguieron á los profetas que ha habido antes de vosotros. Como se vê, n'este dialecto não ha nenhuma distincção formal de genero nem de numero: a pluralidade exprime-se pela adjuncção de _nan_, que é o pronome da terceira pessoa plural: _ees nan_, estes ou aquelles; _pober_, pobre; _pober nan_, pobres. Quando um substantivo é precedido de adjectivos só se segue o signal do plural depois do substantivo: _toer el heende nan_, todos os (aquelles) homens. O presente é geralmente expresso pela fórma _ta_ (==está) e o infinito, tendo todos os infinitos perdido o _r_ final. O futuro é expresso por _lo_ (==luego?). 2. Hespanhol fallado nos campos de Buenos-Ayres e Montevideu M. Maspero publicou em _Mémoires de la Société de Linguistigue de Paris_, t. II, p. 51-65 (Paris, 1875), um artigo sobre as alterações experimentadas pelo hespanhol no Rio da Prata. Essas alterações são sufficientes para lhe dar uma feição dialectal assás bem caracterisada; mas são muito differentes das que determinam os dialectos creolos, como o de Curaçáo, etc.; são principalmente lexiologicas e phoneticas. A vida nova dos europeus n'essas regiões deu principalmente logar á creação de palavras novas do velho fundo do idioma nacional e á introducção de termos das linguas indigenas, por exemplo, de _pié_ fez-se _pialar_, pear um cavallo, de _manco mancarron_, um cavallo máo, que não serve para nada. Alguns dos termos das linguas indigenas adoptados encontram-se tambem no portuguez do Brazil e parte vieram até ás linguas europêas, como _jacaré_, _yacaré_ (termo guarani). As alterações phoneticas encontram-se sobretudo na linguagem do camponio oriental ou _Porteño_. III. DIALECTOS FRANCESES 1. Creolo da ilha Mauricio A este dialecto pertencem algumas poesias da collecção intitulada: _Les essais d'un bobre africain_, seconde édition, augmentée de près du double, et dédiée à madame Borel jeune, par F. Chrestien. Ile Maurice, G. Deroullede et C^{ie}, 1831, pet. in-4. Achámos a indicação d'esta obra no catalogo da bibliotheca de Burgaud des Marets e n'um artigo de M. P. Meyer: _Revue critique_, 1872, artigo 50. A ilha Mauricio, depois do dominio do portuguez e hollandez (1598-1715) esteve em poder dos francezes de 1715 a 1810, em que se tornou possessão ingleza. O dr. A. Bos publicou na _Romania_ muito recentemente (vol. IX, p. 571-578) uma nota sobre o dialecto creolo d'essa ilha, a qual pudémos ler ainda á ultima hora. Resumimos o seu conteúdo. «Esse creolo, diz o auctor, formado para o uso commum, laço de communicação entre as differentes raças que habitam a ilha, é muito desprezado; não se escreve e não é empregado pelos brancos senão para se fazerem comprehender dos seus creados de côr. O plantador de Mauricio não falla creolo senão a seus servos ou trabalhadores, negros ou indios, e ainda a seus cães de caça, repellindo para longe de si a idéa que esse _patois_ informe possa jamais converter-se n'uma lingua. E, todavia, o creolo de Mauricio, como diremos mais abaixo, cresce e prospera de dia em dia; encaminha-se para a fortuna de uma lingua.» Com relação á phonetica notaremos o seguinte: 1. O accento tonico não se desloca. 2. Ha alongamento frequente de _a_: _[-a]-ccent_, _p[-a]-rent_. Esse alongamento é de lei quando ha quéda de consoante: _p[-a]-ti==partir_ (alongamento por compensação). 3. _E_ medial atono muda-se em _i_: _vini_ (venir) ou cae; _e_ final atono cae sempre. 4. _Ui_ muda-se em _i_; _oi_ ás vezes em _o_. 5. _Ch_, _g_ (e, i), _j_ mudam-se respectivamente em _ç_, _z_. 6. _R_ final cae sempre, até nas ligações como _tre_, _bre_; p. ex. _cambe==chambre_. _R_ medial entre vogal e consoante cae igualmente: _Zoze==Georges_. 7. _X_ é pronunciado como _s_ (ç): _éçélan==excellent_. Com relação ás fórmas eis o mais interessante: 1. Não ha distincção de generos: permanecendo a fórma masculina para o masculino e feminino, _mon fame_, _ton lakaze_, ma femme, ta maison. 2. A distincção do numero tende igualmente a desapparecer. Os pronomes pessoaes que são palavras differentes para o singular e plural conservam-se: _moa_, eu; _nou_, nós; _toa_, tu; _vou_, vós. 3. A suppressão do artigo é quasi completa. Como no dialecto da Trinidad o artigo e ainda a preposição partitiva coalescem com varias palavras: _lacaze_, casa (maison); _dilo_, _dipin_, _divin_ (_de l'eau_, _du pain_, _du vin_). Como no dialecto da Trinidad se diz _zoreis_==oreilles (o _s_ é o resto do artigo _les_), assim n'este temos, p. ex,: _zozo_, oiseaux. O _z_ apparece tambem no singular: _ène zozo_, un oiseau, _li zozo_, les oiseaux. 4. Pronomes: _moi_, _toa_, _li_ (lui); _nous_, _vous_, _li_. Os pronomes sujeitos do singular _je_, _tu_, _il_ do francez desappareceram pois; o pronome da terceira pessoa do plural é identico ao do singular. 5. Uma unica fórma verbal--o infinito, é empregada no creolo da ilha Mauricio. O passado é expresso pelo infinito do verbo principal com o infinito auxiliar _fini_: _moi fini travaïé_, j'ai travaillé; _mon fini broçe chambre_, j'ai fait (_brosser_) la chambre. Para a expressão do futuro empregam-se com o infinito diversas locuções adverbiaes. Para alguns verbos, segundo o dr. Bos, essa fórma unica que substitue todas as outras não saíu do infinito, mas sim do presente: _koné_==connais, connaît; _voulé_==voulez. A explicação verdadeira d'essas fórmas está n'outro principio que o artigo que analysâmos nos ministra. Os infinitos em _oir_ e _re_ foram substituidos por infinitos analogicos pelos typos em _e_ (_er_) e _i_ (_ir_); assim _éteindre_ por _éteignir_, _tezi_ por _taire_. Estas fórmas assentam sobre as do plural _éteignons_, _éteignez_, _éteignent_, _taisons_, _taiser_, _taisent_, ou antes sobre os substractos _éteign-_, _tais-_ com a desinencia do infinito _i_. O dr. Bos, tendo primeiro explicado _voulé_ por _voulez_, apresenta-o depois como exemplo d'este processo. 6. O verbo _avoir_ foi substituido por _gagner_ (como na Luisiana). 7. Não se usam conjuncções; as proposições são raras. A construcção approxima-se do typo chinez: _moa kosé vou alé baza_, je vous dis (cause) d'aller au marché (bazar); _toa guété çival pa pati_, tu regarderas (guetter) á ce que le cheval ne parte pas; _mamzèle kosé kóme ça mamzèle pa vini mamzèle faï_, mademoiselle m'envoie vous dire précisément qu'elle ne peut pas venir, parce qu'elle est malade; _vou kontan moa alé promené_, êtes-vous satisfait, aimez-vous que j'aille me promener? Com relação ao vocabulario diz-nos o nosso auctor: «O creolo apenas conservou do francez poucas palavras, as palavras que bastam para exprimir as primeiras necessidades da vida, as relações mais ordinarias. Evidentemente seria difficil e mesmo impossivel tratar um assumpto de philosophia em creolo; o mesmo succedeu provavelmente com o francez nos seus primeiros começos. A essas poucas palavras francezas que formam quasi em totalidade o seu vocabulario, o creolo ajuntou algumas recebidas dos paizes vizinhos: _baza_, mercado, _salam_, bons dias; _tiffin_ (pronuncia-se _toffin_), o paladar, d'onde _tiffiner_, provar, palavras que pela maior parte se acham no francez em uso em Mauricio.» «Esse creolo de Mauricio, apesar de ser tão grosseiro, está longe de querer desapparecer deante das linguas muito mais perfeitas, o francez e o inglez. A maior parte da população de Mauricio é hoje india; póde prever-se que ella augmentará cada dia mais, graças ás immigrações continuas da India. Deante d'essa onda que sobe, a antiga população creola, brancos, negros e mulatos, diminue proporcionalmente. Ora entre indios, chinezes, malgaches, creolos, mulatos e brancos o laço commum é o creolo. Um indio, um chinez, um arabe, um branco (europeu?) tratarão uns com os outros os seus negocios em creolo, e esse neo-francez tomará maior extensão ao passo que a população variegada da ilha for augmentando. É possivel até que n'uma epocha, muito afastada é verdade, o francez desappareça, como a população que o falla tende a diminuir. O creolo, ganhando ao contrario terreno, poderá tornar-se a lingua usual, commum, e até a lingua geral, como elle é já a lingua do povo, a _rustica vulgaris_.» O auctor pensa que o inglez permanecerá exclusivamente como lingua de administração sem influencia sobre o creolo. No francez da ilha Mauricio algumas palavras indicam a proveniencia dos primeiros colonos, porque se acham lá como na Bretanha, de onde elles emigraram; além d'isso esses colonos eram marinheiros. Achando coincidencia de termos entre o creolo d'essa ilha e o de outras possessões europeas no vocabulario em contraposição com o do francez litterario, deve admittir-se que ella tem a causa em que esses colonos levam no seu vocabulario termos do francez de Bretanha e do vocabulario nautico que se encontram nas outras linguas romanicas. No francez de Mauricio diz-se, por exemplo, _amarrer_ não _attacher_, _espérer_, não _attendre_, _larguer_ não _lâcher_, como em portuguez. 2. Creolo da Luisiana Na _Mélusine_ I, col. 495-497, acha-se reproduzido um conto em francez-creolo da Luisiana com traducção franceza. É talvez ocioso recordar aos nossos leitores que os francezes descobriram em 1699 a foz do Mississipi e fundaram em 1717 Nova Orleans, e que tendo a Luisiana feito parte dos dominios de Hespanha desde 1762 até 1800, passou n'esse ultimo anno de novo para o dominio da França, que a cedeu aos Estados Unidos em 1803 por 60 milhões de francos. Esses factos explicam a existencia da colonisação franceza e do dialecto francez-creolo n'aquelle estado da republica norte americana. Eis um excerpto do conto: Ein joie, dan tan lé zot foi, Compair | Un jour, au temps d'autre fois, Bouki couri dîné côté so ouasin | compère Bouc alla dîner chez son Compaire Lapin. Compair Lapîn | voisin, compère Lapin. Compère té pa gagné ein goute do lo pou | Lapin n'avait pas une goutte d'eau boi. Ça fé Compair Bouki di com | à boire. Alors compère Bouc dit ça à Compair Lapin; | comme ça à compère Lapin: | --Mouen non pli, mo pa gagné | --Moi non plus, je n'ai pas do lo; si to olé vini padna, no va | d'eau; si tu veux venir par là, nous fouyé ein pi. | allons creuser un puits. | Compair Lapin soucouyé so la | Compère Lapin secoua la tête: tête: | | --Non! Compair Bouki; gran | --Non compère Bouc; le bon matin bon matin, mo boi la rosé on zerbe; | je bois la rosée sur l'herbe et dans dan jou, kan mo souaf, ma boi dan | le jour, quand j'ai soif, je bois dans piste la ouach. | la piste de la vache. Alors compèreBouc | fouilla son puits tout seul. | Ça fé Compair Bouki fouyé so | Après qu'il eut fouillé le puits, pi li tou sel. Apé li té fouyé pi là, | quand il courut chercher de l'eau kan li couri charché so do lo bon | de bon matin, il vit la trace de matin, li ouâ trace Compair Lapin | compère Lapin au ras du puits. Il au ra so pi. Li graté so la tête et | se gratta et s'écria: li jonglé. | | --Bambail, mo Compair, mo va ! --Mon compère, je vais t'attraper. trapé toi. | | Li couri pran so zouti et lifé ein | Il court prendre ses outils et il gro catin avé boi laurié. Li godroné | fait une grosse catin[6] avec du bois li, godroné li si tan jika lité noi | du laurier. Il la goudronne, la goudronne com négresse guinain. Soleil bas, | jusqu'à tant qu'elle fût noire Compair Bouki couri planté so catin | comme négresse de Guinée. Le soleil déboute au ra so pi. Dan la | tombé, compère Bouc courut nuite la line tapé cléré, Compair | planter sa catin debout au ras du Lapin vini avè so baqué pou charché | puits. Dans la nuit, la lune tapait do lo. Kan li ouâ ti négresse | clair; compère Lapin vint avec là, li rété, li baissé, li gardé ben. | son baquet pour chercher de l'eau. | Quand il voit la petite négresse, | il s'arrête, se baisse et la regarde | bien. | --Ki bétail ci là? | --Quelle bête est-ce là? | Li hélé on li; ti négresse là pa | Il la hèle; petite négresse ne grouyé, li pas réponne. | bouge pas, ne répond pas. _Observações phoneticas._ 1) _u_, _ui_ mudado em _i_: _jiká_==_jusqu'à_, _line_==_lune_, _pli_==_plus_, _pi_==_puits_; 2) _au_ em _ou_: _oussi_==_aussi_; 3) _eu_ em _é_: _pé_==_peu_, _fé_==_feu_, _sel_==_seul_; 4) _oi_ em _è_, _é_: _drète_==_droite_, _cré_==_croire_, _olé_==_vouloir_; 5) _r_, _re_, _le_ apocopados: _ouâ_==_voir_, _noi_==_noir_, _pou_==_pour_, _jou_==_jour_, _cré_==_croire_, _pran_==_prendre_, _zot_, _lot_==_autre_, _enco_==_encore_; _capab_==_capable_; 6) _r_ sincopado entre vogal e consoante ou consoante e vogal: _fanne_==_fendre_, _réponne_==_répondre_, _foce_==_force_, _moceau_==_morceau_, _apé_==_après_; 7) _v_ vocalisado ou supprimido: _choual_==_cheval_, _ouach_==_vache_, _ouâ_==_voir_, _olé_==_vouloir_ (mas _volé_==_voler_); 8) assimilação: _fanne_==_fendre_, _moune_==_monde_, _réponne_==_répondre_; 9) apherese: _cré_==_sacré_, _ti_==_petit_; _baissé_==_abaisser_, _rété_==_arrêter_, _voyé_==_envoyer_, _contré_==_rencontrer_, _gardé_==_regarder_. _Genero e numero._ Não ha nenhuma distincção formal de genero e numero: _ti_ ou _petit_==_petit_ e _petite_; _moceau_==_morceau_ e _morceaux_. _Artigo._ Ora é empregado ou supprimido, assás arbitrariamente: _La main goche collé aussi_, la main gauche se colle aussi; _pié collé_, le pied se colle. O artigo apparece entre o possessivo e o substantivo: _so la main_, sa main; _mo lot la main_, mon autre main (l'autre main), _so la tête_, sa tête. O artigo coalesceu com alguns substantivos: _lo_, eau; _do lo_, de l'eau (litteralmente: _du l'eau_), _so do lo_, son eau (litteralmente: _son du l'eau_), mas _mo fron_, mon front, _so pi_, son puits. N'alguns casos coalesceu com o substantivo o _s_ (z) de _les_, e a fórma com essa prothese é empregada como singular ou plural: _so zepol_, son épaule; _zerbe_, herbe; _zot_, autre (tambem _lot_), _so zouti_, ses outils; _so zoreil_, son oreille, ses oreilles; o mesmo se dá na Trinidad e Mauricio. _Pronomes._ 1.^a pessoa singular, _mo_, _mouen_ sujeito: _mo boi_, je bois; _mouen non pli_, moi non plus; _mouen_ regimen: _lâché mouen_, lâche-moi. 2.^a pessoa singular, _to_ sujeito: _to gardé_, tu regardes; _toi_ regimen: _to cré choual voyé cou pié on toi_, tu croiras qu'un cheval t'a envoyé un coup de pied; _mo va trapé toi_, je vais t'attraper; _qui cogne toi_, qui te cogne. 3.^a pessoa singular, _li_ sujeito e regimen: _li fé_, il fait; _li gratté_, il sa gratta; _li voyé li_, il l'envoya. 1.^a pessoa plural, _no va fouyé_, nous allons creuser (fouiller). As outras fórmas faltam no conto sobre que se baseiam estas nossas observações. Não ha pronome reflexo: _li rété_, il s'arrête; _li baissé_, il s'abaisse; _li gratté_, il se gratta. _Verbo._ Com excepção de _té_==_était_ (_étais_), todas as fórmas verbaes são substituidas pelo infinito, que serve para exprimir o presente, o futuro, o preterito de todos os modos. A fórma _té_ serve porém para exprimir com um infinito (ou o participio passivo?) periphrasticamente o preterito: _li té pá gagné_, il n'avait pás; _li té fouyé_, il eut fouillé; _to té di_, tu avais dit. _Preposição_. As principaes preposições são: _avé_, avec, _dan_, dans, en; _on_, en; _au_; _pou_, pour. A preposição _de_ é supprimida: _pierre tonnair_, pierre de tonnerre; _boi laurier_, bois de laurier; _ta branchaille sec_, tas de branches sèches; _piste la ouach_, piste de la vache; _au ra so pi_, au ras de son puits; _cou pié_, coup de pied. _Suppressão de verbos_, etc.: _Comencé colair_, il commence à être colère; _kan mo souaf_, quand j'ai soif. 3. Creolo da Guyana MM. de Saint Quentin publicaram ha alguns annos um livro contendo contos populares (um só na prosa original), fabulas traduzidas do francez e canções creolas dos auctores n'este dialecto. Temos noticia d'este livro apenas por uma indicação na _Mélusine_, I, 55 (Paris, 1877). Na _Mélusine_, I, n.^{os} 1 e 2, ha traducção, mas sem o original, de dois contos da Guyana franceza. Esta possessão da França foi colonisada por francezes no começo do seculo XVII e permaneceu colonia franceza até hoje, com excepção do periodo de 1808-1817, em que esteve em nosso poder. 4. Creolo da Ilha de S. Domingos Encontram-se um _Voccabulaire, français et crèole_, dialogos e canções n'este dialecto no _Manuel des habitants de Saint-Domingue_, par Duc[oe]urjoly. Paris, Lenoir, 1802, t. II, p. 283-393. 5. Creolo da Trinidad O dialecto francez-creolo d'esta ilha póde estudar-se na obra _The theory and practice of creole grammar_, by J. J. Thomas. Port of Spain (Trinidad), the _Chronicle_ publishing office. In 8.^o, 134. p. Tenho noticia d'essa obra apenas por um artigo de M. Paul Meyer na _Revue critique_, 1872, art. 50. «A conservação entre os negros das Antilhas, diz M. P. Meyer, de _patois_ mais ou menos differentes uns dos outros, mas tendo incontestavelmente uma origem franceza, é um facto digno de attenção. É-o sobretudo na Trinidad que nunca foi colonia franceza. É evidente que todos esses negros vêem originariamente de colonias francezas, e aquelles mesmo da parte meridional dos Estados Unidos que fallam o inglez que nos fizeram conhecer os romances de Mrs. Beech-Stowe ou de M. Kirke, deviam ter fallado outr'ora um _patois_ francez. Parece até que o _patois_ da Ilha de França offerece, na deformação do francez, analogias com o da Trinidad que não são explicadas sufficientemente pela communidade do ponto de partida. A expansão de um _patois_ negro formado do francez depende naturalmente das deslocações a que foram submettidos aquelles que o fallavam, e isso é um assumpto que não é geralmente conhecido, pelo menos d'este lado do Atlantico. «O fundo do _patois_ é francez, com alguns emprestimos do hespanhol (a Trinidad foi colonia hespanhola até 1797) e do inglez. «Ha algumas particularidades curiosas no systema dos sons. A apocope e mais ainda a apherese (o fim da palavra sendo geralmente protegido pelo accento) representam n'elle um grande papel. Assim: _tè_ por _étais_, _était_ (ou antes talvez pelo participio _été_); _sé_ por _serais_, _serait_. Outras suppressões effectuam-se sobre o centro das palavras; assim: _vlez_ por _voulez_, em que vemos a extensão de um facto que o anglo-normando nos offerece em _frai_ (_ferai_), _fras_, _frad_, etc. As liquidas _l_ e _r_ caem deante d'uma outra consoante, e a vogal precedente torna-se longa: _mâgré_ (_malgré_), _pâler_ (_parler_), _môdre_ (_mordre_). Algumas vezes tambem _l_ e _r_ caem depois do accento diante de um _e_ mudo, que seria melhor não escrever; assim: _tabe_ (_table_), _vîte_ (_vitre_). Todos que tiveram occasião de ouvir negros ou mulatos das colonias tiveram occasião de notar os mesmos factos na sua pronuncia, ainda quando elles fallam francez. «Não é á phonetica que pertencem os factos mais caracteristicos do creolo, mas á flexão e á composição das palavras. O que n'essa parte se observa é bem feito para elevar ao mais alto o assombro dos que acham já enormes as formações novas que nos offerecem os idiomas romanicos comparados com o latim. Nós dizemos _celui-là_ emquanto o latim vulgar dizia _eccillum_; mas os negros põem _là_ a todo o instante depois dos substantivos como um demonstrativo a que não ligam já grande valor (M. Th., p. 15). O sentido das particulas e dos artigos está de tal modo obliterado que já não se empregam senão absolutamente confundidos com as palavras a que se juntaram e fazendo corpo com ella: _difé_, _dithé_, _divin_, _dleau_ (p. 18) querem dizer: _feu_, _thé_, _vin_, _eau_; _zoreies_ quer dizer as orelhas; _pêncor_ (p. 122) quer dizer _pas encore_, contracção que nos offerece tambem o provençal _pancaro_. N'um idioma tão empobrecido é só o logar das palavras que indica as relações. Assim n'este proverbio: _Pas fôte langue qui fair bêf pas sa pâler_ (p. 121) (Ça n'est pas faute _de_ langue qui faire b[oe]uf pas savoir parler). «Os verbos parecem, pelo menos muitas vezes, reduzidos a uma só fórma, a do infinito (a não ser que alguma outra fórma tenha sido preservada por causa de uma differença bem sensivel e de um uso frequente). Estudar-se-hão com interesse os diversos tempos compostos com os quaes os negros remediaram as lacunas da conjugação, e achar-se-ha n'isso materia para diversas comparações com os factos parallelos das linguas romanicas. Todavia é mister não esquecer que a comparação não tem aqui senão a mais fraca base. Os negros quando aprenderam o francez, estavam habituados a uma linguagem absolutamente differente, e nunca souberam senão as palavras e as fórmas mais usuaes do seu novo idioma, emquanto o latim vulgar de que saíram as linguas romanicas por desenvolvimentos individuaes e locaes, foi sempre um idioma assás completo, cujas transformações foram assás lentas para que as lacunas tivessem tempo de se encher ao passo que se formaram.» 6. Creolo da Martinica Cremos que versa principalmente sobre este dialecto a obra seguinte, que conhecemos apenas pelo catalogo da bibliotheca de Burgaud des Marets: _Catéchisme en langue créole, précédé d'un essai de grammaire sur l'idiome usité dans les colonies françaises_, par M. Goux, missionnaire à la Martinique. Paris, Vrayet de Suroy, 1842, in 8.^o Mais recente é o livro de Turiault: _Étude sur le langage créole de la Martinique_. Brest. 236 pp. in 8.^o en deux volumes. 1876. (Paris, Viaut.) Contém uma serie de enigmas, numerosos proverbios, alguns contos, algumas canções e diversas traducções do francez. Vid. _Mélusine_, I, 55. Paris, 1877. IV. LINGUA FRANCA Littré, _Dict. de la langue française_, s. v. _franc_ 4, define lingua franca: «jargon mélé d'italien, d'espagnol, etc. à l'usage des Francs de l'Orient» isto é, dos europeus do Levante. J. Creswell Clough no ensaio _On the existence of mixed languages_, p. 11, define, fundado na auctoridade de Malte Brun, a lingua franca do Mediterraneo como uma mistura de catalão, limosino, siciliano e arabe, originada nos estabelecimentos de escravos dos mouros e turcos. O auctor não conheceu porém nenhum specimen d'essa lingua. (_The Athenaeum_, 1877. January to June, p. 545.) Segundo o mesmo periodico inglez, vol. cit. p. 608, ha um _Dictionnaire de la langue franque, ou petit mauresque, à l'usage des français en Afrique_, publicado ha alguns annos em Marselha. O vocabulario comprehende palavras italianas, algumas fórmas approximando-se do hespanhol e ainda um certo numero de termos locaes usados na Argelia. O principe L. L. Bonaparte considera, com rasão, a lingua franca como estando para com o italiano litterario na mesma relação que o indo-portuguez para com o portuguez, os dialectos creolo-francezes para com o francez, o negro-hollandez para com o hollandez, (_Athenaeum_, vol. cit., p. 640 e 703.) Lingua franca | Italiano | Bon giorno, Signor; comme ti | Buon giorno, Signore; come stai?--Io star?--Mi star bonu, e ti?--Mi | sto bene, e tu?--Io son contente star contento mirar per | di vederti.--Grazie.--Poss'io ti.--Grazia.--Mi pudir servir per ti | servirti in qualche cosa?--Molte per qualche cosa?--Muciu grazia.--Ti | grazie.--Dà una seggiola al dar una cadiera al Signor.--Non | Signore.--Non ho bisogno. Io sto bisogna. Mi star bene | bene così.--Como sta il tuo acousì.--Comme star il fratello di | fratello?--Sta molto bene. ti?--Star muciu bonu. | (_The Athenaeum_, 1877, 1.^o sem., p. 640). L. L. Bonaparte dá as seguintes regras que caracterisam a lingua franca: 1.^a Os nomes não têem plural: _amigo_==amigo e amigos. 2.^a Os verbos não têem conjugação, mas só um futuro periphrastico e um participio terminando em _ato_ ou _ito_: _mi_, _ti_, _ellu_, _noi_, _voi_, _eli_, _andar_ significam não só eu vou, tu vaes, elle vae, nós vamos, vós ides, elles vão, mas tambem eu ia, etc., eu fui, etc.; _bisogno andar_ significa eu irei, etc. 3.^a _Star_ significa _ser_ e _ter_, quando são usados como verbos auxiliares. 4.^a _Avir_ ou _tenir_ significam _ter_, mas só com a idéa de _possuir_. 5.^a O regimen directo dos pronomes pessoaes é precedido da preposição _per: mi mirar per ella_, eu vejo-o. Molière no acto IV do _Bourgeois gentilhomme_ deu uma imitação da lingua franca. «Scène X.--_Le Muphti, Dervis, Turcs, chantans et dansans; Monsieur Jourdain_, vêtu à la turque, la tête rasée, sans turban et sans sabre. _Le Muphti, à M. Jourdain._ Se ti sabir, Ti respondir, Se non sabir, Tazir, tazir. Mi star muphti, Ti qui star si? Non intendir, Tazir, tazir. «Scène XI.--_Le Muphti, Dervis, Turcs chantans et dansans._ _Le Muphti._ Dice, Turque, qui star quista? Anabatista? anabatista? _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Zuinglista? _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Coffita? _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Hussita? Morista? Tronista? _Les Turcs._ Ioc, ioc, ioc. _Le Muphti._ Ioc, ioc, ioc. Star pagana. _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Luteranos. _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Puritana? _Les Turcs._ Ioc. _Le Muphti._ Bramina? Moffina? Zurina? _Les Turcs._ Ioc, ioc, ioc. _Le Muphti._ Ioc, ioc, ioc. Mahametana? Mahametana? _Les Turcs._ Hi Valla. Hi Valla. _Le Muphti._ Como chamara? Como chamara _Les Turcs._ Giourdina, Giourdina. _Le Muphti_ (sautant). Giourdina, Giourdina. _Les Turcs._ Giourdina, Giourdina. _Le Muphti._ Mahameta, per Giourdina, Mi pregar, sera e matina. Voler far un paladina De Giourdina, de Giourdina; Dar turbanta e dar scarrina, Con galera, e brigantina, Per deffender Palestina, Mahameta, per Giourdina, Mi pregar sera e matina. Star bon Turca Giourdina? _Les Turcs._ Hi Valla. Hi Valla. _Le Muphti_ (chantant et dansant). Ha la ba, ba la chou, ba la ba, ba la da. _Les Turcs._ Ha la ba, la la chou, ba la ba, ba la da. «Scène XIII.--_Le Muphti, Dervis, Monsieur Jourdain, Turcs, chantans et dansans._ _Monsieur Jordain_ (après qu'on lui a ôté l'Alcoran de dessus le dos). Ouf! _Le Muphti_ (à M. Jourdain). Ti non star furba? _Les Turcs._ No, no, no. _Le Muphti._ Non star forfanta? _Les Turcs._ No, no, no. _Le Muphti_ (aux turcs). Donar turbanta. _Les Turcs._ Ti non star furba? No, no, no. Non star forfanta? No, no, no. Donar turbanta. _Les Turcs dansans_ mettent le turban sur la tête de _M. Jourdain_ au son des instruments. _Le Muphti_ (donnant le sabre à _M. Jourdain_). Ti star nobile, non star fabbola, Pigliar schiabolla. _Les Turcs_ (mettant le sabre à la main). Ti star nobile, non star fabbola Pigliar schiabolla _Les Turcs dansans_ donnent en cadence plusieurs coups de sabre à _M. Jourdain_. _Le Muphti._ Dara, dara Bastonnara. _Les Turcs._ Dara, dara Bastonnara. _Les Turcs_ donnent à _M. Jourdain_ des coups de bâton en cadence. _Le Muphti._ Non tener honta, Questa star l'ultima affronta. _Les Turcs._ Non tener honta, Questa star l'ultima affronta.» O uso frequente na lingua franca da palavra _sabir_, principalmente na expressão _mi no sabir_ com que os levantinos e argelinos respondiam ás perguntas que lhes faziam os estrangeiros e que elles não comprehendiam, fez dar a essa lingua o nome de _sabir_, _lingua sabir_. Vid. Littré, _Dictionnaire de la langue française. Supplément_, s. v. _Sabir_. A. Darmesteter, _De la création actuelle de mots nouveaux dans la langue française_, p. 261, n. define ainda: «Le _sabir_ ou langue franque, mélange d'italien, de français, de provençal et d'arabe parlé par les marins de la Méditerranée». Algumas phrases ou expressões da lingua franca chegaram, sem duvida por intermedio dos marinheiros, até ao calão ou girias dos diversos povos da Europa. No _cant_ (calão de Inglaterra) ha por exemplo: _nantee dinarly_ (não tenho) nenhum dinheiro, da lingua franca; _niente dinaro_, do italiano _niente_, nada (==fr. _néant_) e _denario_ (==port. _dinheiro_, hesp. _dinero_, fr. _denier_, do lat. _denarius_). Em portuguez ha _nentes_ do ital. _niente_, que não veiu ao que parece por intermedio da lingua franca. _Nicles_, nada, da giria dos garotos portuguezes parece estar por _niks_ e corresponder ao _nix_ da lingua franca. «The well-known _Nix mangiare_ stairs at Malta derive their name from the endless beggars who lie there and shout «Nix mangiare», i. é. «nothing to eat»,--an expression which exhibits remarkably the mongrel composition of the Lingua Franca, _mangiare_ being italian, and _Nix_ (germ. _Nichts_), an evident importation from Trieste, or other Austrian seaport.» _The Slang Dictionary_, apud Johan Storm, _Englische Philologie_ I, 162-3. Storm junta em nota a pag. 163: Li n'um romance maritimo inglez a seguinte lamuria de um pedinte maltez: «_Me_ molto miserabile, signore! _Nix_ padre, _nix_ madre, _nix_ mangiare _per sixteen days_, per Gesù Christo.» _Nix_ é considerado geralmente na Italia pelo povo como a negação allemã ou estrangeira. Mas o emprego de uma expressão como _nix_ ou de termos extranhos não determina de modo algum o caracter da lingua franca. O emprego de expressões como _sixteen days_ é um accidente de momento que se encontra em todas as linguas: quando a gente que as falla se acha em contacto com estranhos recorre á sua maior ou menor provisão de termos estrangeiros. A composição da lingua franca não é realmente mais _mongrel_ que por exemplo a do inglez, que apresenta vocabulos provenientes de innumeras linguas. V. CONSIDERAÇÕES GERAES Não foram só as linguas romanicas que serviram de base á formação de dialectos como os que acâbamos de noticiar: podemos dar indicação de dialectos similhantes de origem germanica, a cujo estudo procederemos logo que tenhamos materiaes sufficientes. O _negro-english_, dialecto assim chamado impropriamente, é fallado na colonia hollandeza de Surinam, na Guiana, por uma população de cêrca de 100:000 individuos, dos quaes 90:000 negros e 10:000 de origem européa. As fórmas grammaticaes estão reduzidas n'este dialecto, como em todos os similhantes a um minimo. _The Bible of Every Land_, p. 213, dá noticia de traducções dos Psalmos e do Novo Testamento no _negro-english_. Julgâmos terem por objecto este dialecto os livros seguintes que ainda não lográmos ver: _Kurzgefasste neger-englische Grammatik._ Bautzen, 1854. Van der Vegt, _Proeve eener handleiding om het neger-engelsch_. O creolez (ingl. _creolese_) é um dialecto tendo por base o hollandez, fallado pela população negra das ilhas de Santa Cruz, S. Thomaz e S. João (Indias Occidentaes); não tem distincção de genero nem numero, nem declaração de nomes, nem conjugação simples de verbos. Em 1781 o governo da Dinamarca fez imprimir em Copenhagen uma traducção do Novo Testamento n'esse dialecto; em 1818 fez-se nova edição. Segundo _The Bible of Every Land_, pag. 212, parece que o creolez caíu em desuso. O inglez serviu de base na China á formação dialectal chamada _Pidgin English_ (_pidgin_ é approximadamente a pronuncia chineza do inglez _biznes_, _business_). Não vimos ainda a obra de Leland, _Pidgin English singsing, or Songs and Stories in the China-English dialect_. London, 1866. Na _Introduction to the Study of Sign Language among the north american Indians_ by Garrick Mallery (Smithsonian Institution-Bureau of Ethnology. Washington, 1880.) p. 12, achâmos a seguinte noticia: «Os kalapuyas do Oregão meridional usaram até ha pouco uma linguagem de signaes, mas gradualmente adoptaram para a communicação com o estrangeiro a lingua composta, commummente chamada giria _tsinuk_ ou giria _chinook_, que provavelmente se originou para fins commerciaes nas margens do Columbia antes da chegada dos europeus, fundada sobre o tsinuk, tsiholi, nutka, etc., mas agora enriquecido por termos francezes e inglezes, e esqueceram quasi inteiramente os seus antigos signaes. A prevalencia d'esta lingua mestiça, formada nas mesmas condições que produziram o _pigeon-english_ ou a _lingua franca_ do oriente, explica a falta notada de lingua de signaes entre as tribus da costa noroeste». A giria tsinuk não é talvez, apesar do que nos diz G. Mallery, mais do que um dialecto inglez da natureza dos que são objecto do presente estudo. Ninguem ainda, que saibâmos, viu com clareza o verdadeiro caracter e reconheceu as leis geraes que presidem á formação de dialectos de que nos occupâmos. O eminente philologo P. Meyer tocou a nosso ver em um dos pontos essenciaes da questão, mas por falta sem duvida de termos de comparação não a collocou á verdadeira luz: «Estudar-se-hão com interesse, diz elle, com relação ao dialecto da Trinidad, os diversos tempos compostos pelos quaes os negros remediaram as lacunas da conjugação, achar-se-ha materia para diversas comparações com os factos parallelos que apresenta á formação das linguas romanicas. Nada deve porém esquecer que a comparação tem aqui a mais fraca base. Os negros, quando aprenderam o francez, estavam habituados a uma lingua absolutamente differente e nunca souberam mais que as _palavras e as fórmas mais usuaes_ de seu novo idioma, emquanto o latim vulgar de que saíram por desenvolvimentos individuaes e locaes as linguas romanicas, foi sempre um idioma sufficientemente completo, cujas transformações foram assás lentas para que as lacunas tenham tido tempo de se encher facilmente ao passo que se formaram». _Rev. critique_, 1872 artigo 50. Na passagem seguinte, M. P. Meyer mostra ter repugnancia em admittir que a formação de dois dialectos creolos obedeça a leis perfeitamente identicas: «Parece que o _patois_ da ilha de França offerece, na deformação do francez, analogias com o da Trinidad que não são explicadas sufficientemente pela communidade do ponto de partida». O dr. Bos (_Romania_ IX, 571) admitte já a independencia d'essas formações analogas, sem ver ainda aqui a acção de leis geraes: «Os diversos creolos (francezes) que se fallam nas Antilhas, na America, nas ilhas Mascarenhas, no Oceano Indico, têem todos um ar de familia, uma similhança ainda mais accentuada que a que existe entre as linguas neo-latinas, e devida provavelmente á sua maior mocidade e á sua maior proximidade da lingua mãe. Alem d'isso essa lingua mãe, o francez, é unica para os idiomas creolos; e o latim vulgar, quando deu origem ás linguas neo-latinas, tinha talvez já perdido a unidade, e experimentado as influencias regionaes que deviam transformal-o, aqui em francez, acolá em provençal, alem em italiano, etc. Fóra pois da questão de tempo, a grande similhança que existe entre as linguagens creolas provém provavelmente da unidade da lingua que lhe deu origem: o francez representa aqui o papel do latim vulgar com relação ás linguas romanicas». As idéas geraes com relação á formação d'estes dialectos expressas por E. Tesa no seu citado estudo sobre o creolo de Curaçáo não me parecem tambem exprimir a verdade dos factos. «Due studj sono a farsi nella istoria delle lingue: la libertà e la servitù. Una favella si disgiunge da una grande famiglia, serbando parte del tesoro commune e nei valori radicali che si incorporano in un grupo di suoni, e ne' canoni derivativi, e nelle flessioni. Questa ricchezza ereditata non giace inerte. È un grande albero: e dei molti rami, quale si leva più alto, quale si arresta a mezza la via; ma in ciascuno è una vita sua propria: vi discorre lo stesso succo a nutrirli, ma è vario lo spessore degli strati e le virtú: tutto è un agitarsi, un crescere; finchè le due ultime foglie, che si toccano in mezzo al sereno dei cieli, non rammentano più che la radice commune è nascosta in un luogo solo e circondata di poca terra. «Beata la nazione alla quale, in codesta opera de' secoli, la lingua si disvolge senza ingiustamente comandare e senza miseramente servire; perchè anche negli organismi vocali così corrompe il vedersi schiavo como il farsi tiranno. «Bensì le lingue, presto o tardi, si incontrano, si impinguano, si tarpano l'una l'altra; o sia l'imitazione delle idee come nella prosa de' Cechi e de' Magiari, guidata in tanta parte dal tedesco: o da questa lingua in quella si trasfonda la somma delle parole, como le sanscrite nel tamulico; le turche nel greco, nell'armeno, nello schipetaro, nel româno, nel bulgaro, nel serbo. Talora poi le forme stesse o cedeno alle alle straniere o le accettano cooperatrici a rappresentare il pensiero; come nel persiano e più nel turco e, con istrazio peggiore, nel huzuresco. «Un esempio di queste corruzioni profonde lo veggiano a Curassao; e non osservato, ch'io sappia, dai linguisti. Non ho trovato che un libro; e bisognerebbe sapere se altri ve ne sieno e serbino tutti le forme spagnuole, o incomincine a corrompere anche la lingua degli Olandesi, padroni nuovi. Poi sarebbe utile a conoscere QUALE DIALETTO VI PARLASSERO GLI ABORIGENI; quando sia scomparso o se ancora se ne conservino le tracce; finalmente quanto sieno in quel picciolo popolo i discendenti di Spagna i quanto di Olanda... «Certo da questo breve studio sul curassese saremo condotti a ristringere la opinione di Augusto Fuchs che lo spagnuolo, dominatore in tanta parte di America, non si mescolò a nessuna delle lingue indigene da formare um nuovo dialetto (Cfr. _Die romanischen Sprachen._ Halle, 1849, p. 7). Non s'è mescolato; ma IL PENSIERO NAZIONALE TRASCINÒ DIETRO A SÈ LE FÓRME SPAGNUOLE E GLI AVANZI; così che ne derivò una favella che non assomiglia certo a nessuno dei dialetti metapireneici. «A me pare che uscirebbe un bel libro, ma da non farsi in Europa, chi si ponesse a ricercare come le lingue latine rimutassero; il francese nel Canada, in Haiti; il portoghese nel Brasile e lungo le coste d'India; a Cuba, a Portorico e via via lo spagnuolo. SAREBBE A DISCOPRIRSI LA GRAMATICA INDIGENA; E DEDURNE LE LEGGI DISSOLUTIVE DI QUELLA PAROLA, là inerte o quasi, che fu stromento a forti pensiere e alle grazie dell'arte in bocca a Dante, a Cervantes, a Voltaire.» Como se vê o douto professor de Pisa inclina-se a admittir como explicação dos dialectos creolos uma accommodação das fórmas romanicas á grammatica das linguas dos povos entre os quaes esses dialectos se formam. Alguns eruditos brazileiros, conhecedores dos dialectos indigenas, admittem influencia grammatieal d'estes dialectos sobre o portuguez do seu paiz. «A lingua fallada pelos primitivos incolas d'El-Dorado, a lingua do selvagem, que teve voga nos primeiros tempos do desenvolvimento do Brazil, que durante dois seculos entre os proprios colonos europeus era «a lingua geral» e de uso quotidiano no tracto commum, usada e fallada até no pulpito, ainda hoje fallada no Paraguay, teve tal importancia já, que, temendo-se que fosse esquecida a lingua portugueza, mereceu ser proscripta expressamente a ponto de a mandarem abolir pela provisão de 12 de outubro de 1727 (_Jornal do Timon_, t. 2.^o; p. 315). E depois, apezar de tudo, ella perdura ainda, já não digo pelo facto de subsistir hoje entre varias e numerosas tribus do Amazonas e de Matto Grosso, porém, perdura na lingua portugueza, fallada pelos descendentes dos Brazis, dando-lhe um feitio caracteristico que distingue essencialmente essa falla brazileira da portugueza, não só na inflexão da voz, não só na phonetica, mas ainda no tornêo grammatical e no phraseado que tem _seu que_ de novo, não usado na terra lusitana, e a final em grande numero de vocabulos de todo não portuguezes. A «lingua geral» é certo, morreu com o indio e ou si não morreu ainda, vae morrer e desapparecerá com o derradeiro selvagem, que a locomotiva da civilização tem de aniquilar na sua marcha, no seu «avança para deante». Porèm, como em seguida á derrubada, onde era a mata virgem, surge a capoeira, do mesmo modo no campo de exterminio, do qual se-eliminou o indio, subsistem o mameluco, o caboclo, o caipira, o matuto; e essa pobre gente que constitue a nossa gente da roça, os nossos _officiaes de officio_, a nossa soldadesca e a nossa maruja, concorre sem a menor duvida com a maior percentagem para formar o algarismo da nossa população. Desappareceu o indio (_abá_), o indigena, o autochtone (_t-yby-abá_==_typynabá_), o selvagem (_tapyyia_),--mas ficou o caboclo, o perfilhado por branco (_caraïb-oca_==_caribóca_), o mameluco, o filho da mulher india (_membyrucá_), o pelle tostada (_caipíra_), ou o homem corrido, envergonhado, abatido, submettido (_kuaipira_). E esses mamelucos, caboclos e caipiras, fallando a lingua do «outro», do extrangeiro, do homem de lá longe, do emboaba, (_amo-abá_), fallando essa lingua corrompida pelo fallar do africano, do selvagem negro (_tapyyñuna_), conservam no sotaque, no phraseado, reminiscencias da «lingua geral» que vão se-fazer ouvir ainda no seio do parlamento, onde desgraçadamente predomina um francez assaz eivado de francezismos e tambem já de não poucos inglezismos. Foi proscripta a lingua do indio (o _abá ñeenga_), mas na lingua do branco (no _caraï-ñeenga_) fallada pelos matutos, e reproduzida ás vezes com bastante merito em escriptos litterarios, subsistem dizeres _sui generis_, oriundos da lingua materna, certamente _materna_ pois que elles são os mamelucos, os filhos da mulher indigena, são os caboclos oriundos do homem branco. Como muito bem diz o sñr. dr. Couto de Magalhães, na _linguagem popular_ do Brazil ha não só grande _quantidade de vocabulos tupis_ ou _guaranis_, mas ainda _phrases, figuras, idiotismos e construcções peculiares_. Quanto ao vocabulario é incontestavel, e com um pouco de attenção vê-se, que no portuguez brazilico abundam dicções de linguas americanas em numero mais consideravel talvez que o das dicções arabicas que se-conservam no lexicon portuguez. Dizemos «linguas americanas», porque na realidade não ha só vocabulos do _abáñeenga_, e sim tambem do _chilidugu_, do _kechua callu_, do _karai-arianga_, e outras, como sejam _brisa_, _canôa_, _furacão_, _piroga_, _mate_, _guasca_, _guampa_, _gaûcho_, etc. Nas sciencias naturaes (mórmente na botanica) e na geographia é mais que consideravel o numero de vocabulos oriundos de linguas americanas[7].» «Nem o tupi oriental, aquelle que era fallado na costa quando os jesuitas o escreveram, e que faz objecto dos diccionarios e grammaticas que nos legaram; nem a lingua Kirirí, um tupi que era fallado pela tribu d'esse nome, não são hoje linguas vivas. Assim como os selvagens ou desappareceram ou subsistem mestiçados, assim a lingua ou desappareceu ou mestiçou-se no rustico fallar do nosso povo, conseguindo introduzir na lingua portugueza do Brazil centenares de raizes[8]. «O cruzamento d'estas raças (indigenas do Brazil, negros e brancos) ao passo que misturou os sangues, cruzou tambem (se nos é licito servirmo-nos d'essa expressão) a lingua, sobretudo a linguagem popular. É assim que, na linguagem do povo das provincias do Pará, Goyaz, e especialmente de Matto-Grosso, há não só quantidade de vocabulos tupís e guaranís accommodados á lingua portugueza e n'ella transformados, como ha phrases, figuras, idiotismos, e construcções peculiares ao tupí. Este facto mostra que o cruzamento physico de duas raças deixa vestigios moraes, não menos importantes do que os do sangue. O notavel professor norte-americano C. F. Hartt nota que são rarissimos os verbos portuguezes que têem raizes tupís, e cita como um d'esses raros exemplos, talvez unico, o verbo _moquear_. Se o illustre professor houvesse viajado outras provincias, veria que esse exemplo não é isolado, e que não temos um, mas muitos verbos vindos do tupí, e alguns d'elles tão expressivos e energicos que não encontrâmos equivalentes em portuguez; citarei entre outros os seguintes: _espocar_ (Pará) por: arrebentar abrindo; _petequear_ (Minas, S. Paulo) por: jogar; _entocar_ (geralmente em todo o Brazil) por metter-se em buraco, ou figuradamente, por: encolher-se, fugir á responsabilidade; _gapuiar_ (Pará, Maranhão) por: apanhar peixe; _cutucar_ (geral) por: tocar com a ponta; _espiar_ (geral) por: observar; _popocar_ (Pará, Maranhão) por: abrir arrebentando; _pererecar_ (geral) por: caír e revirar; _entejucar_ por: embarrear; _encangar_ por: metter os bois no jugo; _apinchar_ por: lançar, arremessar; _capinar_ por: limpar o matto; _embiocar_ por: entrar no buraco; _bobuiar_ por: fluctuar; _catingar_ por: exhalar mau cheiro; _tocaiar_ por: esperar, etc., são outros tantos verbos com que o tupí enriqueceu a lingua popular dos habitantes do interior do Brazil, lingua ás vezes rude, não o contestâmos, mas ás vezes tambem de uma energia e elegancia de que só póde fazer idéa, aquelle que tem estado em uma roda de gaúchos folgazãos a ouvil-os contar a historia de seus amores, suas façanhas de valentia, ou as lendas, ás vezes tão tocantes e poeticas de suas superstições, metade christãs, metade indigenas[9]... «Se dos verbos passassemos aos substantivos, nomes de animaes, logares, plantas, ver-se-hía que nada menos de mil vocabulos, quasi uma lingua inteira, passou e veiu fundir-se na nossa, assim como com o cruzamento tem passado e ha-de continuar a passar o sangue indigena a assimilar-se e confundir-se com o nosso[10].» Como se vê os dois escriptores brazileiros, que têem um longo conhecimento do tupi-guarani, nenhum facto apresentam que prove a influencia grammatical que admittem: as suas indicações resumem-se a factos lexiologicos, alguns dos quaes são muito contestaveis. Não entraremos n'um exame critico directo das diversas opiniões que acabâmos de citar. Os materiaes por nós accumulados permittem-nos assentar os seguintes principios, em face dos quaes é facil julgar essas opiniões. 1.^o _Os dialectos romanicos e creolos, indo-portuguez e todas as formações similhantes representam o primeiro ou primeiros estadios na acquisição de uma lingua estrangeira por um povo que falla ou fallou outra._ Este principio é por assim dizer evidente. Basta observar como os estrangeiros que não têem estudos grammaticaes começam a fallar a lingua de um paiz que não é o seu para a ver perfeitamente confirmada. _Mi no fallá portuguese_ é uma phrase typica que todos conhecemos na bôca dos inglezes. Os factos observados nos dialectos creolos de Santo Antão, Guiné, etc., revelam _graus diversos na acquisição do portuguez_. A lingua franca póde ser considerada como o typo mais rudimentar das formações de que nos temos occupado. Aqui devemos observar um facto interessante: consiste elle em que o povo de qualquer paiz achando-se em contacto com estrangeiros que não fallam a sua lingua reduz esta tambem, por assim dizer instinctivamente, ao mesmo typo privado de fórmas grammaticaes que caracterisam os dialectos creolos[11]. Nos contos populares, os mouros, os turcos e os negros são apresentados pelo povo a fallar uma lingua em que o infinito substitue as outras fórmas verbaes; assim em G. Pitré, _Fiabe, novelle e racconti popolari siciliani_, I, 17, n.^o 1, ha o seguinte dialogo entre um turco e S. Nicolau: «Bonciornu Santu Nicola!»--«Addiu Maumettu.»--«_Pigghiari_ tanticchia d'ogghiu?»--«_Pigghiari_ quanto vôi.» Póde comparar-se a versão portugueza d'essa facecia em a nossa collecção de _Contos populares portuguezes_, n.^o 72. O douto e indefesso collector das tradições sicilianas ministra-nos a seguinte nota: «Nel _Malmantile_ del Lippi annotato dal Minucci, vol. III, pag. 257, a proposito della frase del Lippi _star usanza_ si legge: «_Star usanza_. È detto alla maniera degli stranieri, specialmente tedeschi, o turchi, che cominciando a parlar un poco Italiano, si servono quasi sempre dell'infinito in luogo di qualsivoglia tempo. È curiosa la perifrase d'uno schiavo turco, che avendo rubato un turibolo d'argento, volendolo vendere, andava dicendo negli orecchi a coloro, ch'egli supponeva lo potessino comprare: _Voler comprar un andare un venire un sentir buono?_» É com razão que M. E. Egger nas suas _Observations et réflexions sur le développement de l'intelligence et du langage chez les enfants_ (Paris, 1879. 8.^o) compara a linguagem das creanças aos dialectos creolos: «A vingt-huit mois l'enfant connaît le sens des trois mots: _ouvrir_, _rideau_ et _pas_ (négation); déjà il les rapproche avec une certaine dextérité, en les acompagnant du geste et du monosyllabe _ça_. _Pas ouvrir ça_ signifie «la fenêtre est fermée»; _pas rideau ça_ signifie «la fenêtre n'a pas de rideau». On reconnaît là ces grossières façons de parler qu'on décore parfois du nom de patois nègre, parce que les nègres de nos colonies n'empruntent guère à la langue de leurs maîtres qu'un petit nombre de vocables, les plus nécessaires, et qu'ils les accouplent, selon le strict besoin, sans aucun souci de la conjugaison et même de la syntaxe.» Ob. cit., p. 44. Os dialectos de que nos temos occupado não são pois o resultado de uma transformação lenta, gradual, tendo por ponto de partida principal a alteração phonetica, como a que se opera nas linguas que seguem o curso normal da sua evolução, como a que transformou o latim em portuguez, hespanhol, provençal, italiano e valachio; nos dialectos creolos e similhantes a alteração phonetica é o menos; com ella pouco se explica da estructura morphologica e syntactica d'essas fórmas de linguagem. Bopp e Diez são de muito pouca utilidade immediata, os principios da grammatica comparada usual de pouco nos servem para entendermos aquelles dialectos. A transformação da linguagem em virtude da alteração phonetica é um phenomeno de base physiologica; a formação dos dialectos creolos é no que tem de essencial um phenomeno psychologico. Formam-se elles rapidamente, para acudir á necessidade das relações; é o povo inferior pela raça, pelo estado de civilisação, mas ao mesmo tempo mais forte de instinctos, mais rico de espontaneidade, é esse que os forma com os materiaes da lingua do povo superior, que em regra não desce a aprender ou mesmo a dar attenção ás expressões do barbaro, do selvagem. Ao ouvido do povo inferior chegam primeiro como ondas sonoras tumultuosas as palavras do povo superior, depois aquelle percebe como que um rythmo, depois n'aquelle oceano de palavras descobre alguns pontos firmes, salientes; fixa-se n'elles: são as fórmas mais geraes e frequentes da linguagem; ellas bastam--a lingua nova, o instrumento indispensavel para o trato está forjado; enriquecel-o, approximando-o do typo perfeito, é obra do tempo, se o houver, se as condições o permittirem; mas a riqueza não será muitas vezes mais do que anomalia, porque aquella fórma primeira de linguagem, nascida de um trabalho todo espontaneo, era perfeitamente coherente. Por fim dá-se muitas vezes um phenomeno curioso: entendido do povo superior, do povo que em geral manda, o povo inferior não quer saber mais nada da lingua d'elle, contentando-se com o dialecto que formou: então o povo superior ver-se-ha obrigado a fallar a sua propria lingua alterada[12]. É innegavel que a primeira reducção morphologica (podemos assim definir o processo de formação dos nossos dialectos) que uma lingua experimenta na bôca de um povo que tinha já outra deixa vestigios profundos, ainda quando o povo acaba por esquecer completamente a sua lingua propria e por conhecer de um modo mais completo a morphologia da lingua que adopta de um outro povo. Os processos periphrasticos da primeira phase da acquisição da lingua estranha não desapparecerão de todo, e mais tarde, quando a alteração phonetica, que elles favorecem, obscurecer certas fórmas grammaticaes, esses processos voltarão a ser normaes na lingua. Não será a causa d'esta natureza que serão devidos os futuros periphrasticos, por exemplo, nas linguas romanicas? Até hoje não se determinou com precisão o grau e caracter da influencia exercida por um povo sobre a lingua estranha que a conquista ou outras causas lhe faz adoptar. O erro capital n'esta questão consiste, a nosso ver, em se suppor que a lingua estranha é alterada pelo typo da lingua propria. O estudos dos dialectos creolos permitte-nos resolver esta questão. 2.^o _Os dialectos romanico-creolos, indo-portuguez e todas as formações similhantes devem a origem á acção de leis psychologicas ou physiologicas por toda a parte as mesmas e não á influencia das linguas anteriores dos povos em que se acham esses dialectos._ Os factos accumulados por nós mostram á evidencia que os caracteres essenciaes d'esses dialectos são por toda a parte os mesmos, apesar das differenças de raça, de clima, das distancias geographicas e ainda dos tempos. É em vão que se buscará, por exemplo, no indo-portuguez uma influencia qualquer do tamul ou do singalez. No dialecto macaista a formação do plural por duplicação do singular póde attribuir-se a uma influencia chineza, mas esse processo é tão rudimentar que nenhuma conclusão podemos fundar sobre elle. No dialecto da ilha de Sant'Iago _muito muito_ é um superlativo. Os phenomenos phoneticos que nos offerecem os dialectos creolos nada têem de especial: a suppressão do _r_ final, a tendencia para o iotacismo, por exemplo, apparecem-nos quasi por toda a parte; as proprias excepções são as mesmas: assim temos _ser_ e não _sê_ em Ceylão, em Macau, no archipelago de Cabo Verde. Nenhum som das linguas indigenas foi transportado para os dialectos creolos; mas alguns sons das linguas europeas foram modificados. Ora na propria Europa se notam modificações similhantes. A seguinte observação do dr. Bos sobre o creolo da ilha Mauricio é, emquanto aos sons, quasi inteiramente applicavel a todos os dialectos similhantes: «É provavel que os sons do francez que o negro não pôde reproduzir faltavam na sua lingua. A influencia das linguas negras reduziu-se a isso; ellas não.... implantaram nenhum som novo; ellas supprimiram os que ellas ignoravam[13], para os substituir por outros mais ou menos analogos: _e_ mudo por _i_, _ui_ por _i_ , _j_ por _z_, _ch_ por _ç_, etc.» No fallar brazileiro, por exemplo, não parece haver nenhum dos sons particulares do tupi-guarani. A acção das leis psychologicas geraes vae quasi sempre nos dialectos de que nos occupâmos até ás feições miudas; assim não só a periphrase com as fórmas mais geraes nos apparece para substituir as fórmas não adquiridas, mas ainda a mesma preferencia por certas fórmas auxiliares se nota quasi por toda a parte; assim o presente formado com _ta_ (==_estar_) em Macau, nas ilhas de Cabo Verde, em Curaçáo; em Ceylão como em Curaçáo _lo_ é o elemento formativo do futuro. Na Luisiania _té_==_était_ serve para formar o imperfeito. A preferencia dada n'esses dialectos aos pronomes regimens, que vêem occupar o logar dos pronomes sujeitos encontra-se entre nós no fallar das creanças e tem grande extensão nas phrases populares das nossas linguas europêas[14]. A propria selecção lexiologica, isto é, a preferencia dada a certos termos, manifesta a acção das mesmas leis geraes, das mesmas tendencias nas formações que estudâmos, apesar das differenças de raças e de meios; assim para significar fallar ou dizer encontrâmos em Ceylão, Curaçáo, archipelago de Cabo Verde, etc., a palavra _papiá_, o que é tanto mais interessante quanto esse termo não parece existir hoje nem em hespanhol nem em portuguez. O substantivo _misté_ (_mister_) em Ceylão, em Macau, em Curaçáo, no archipelago de Cabo Verde, tem o valor de um verbo significando ser preciso, ter necessidade de, dever. _Pamóde_ e _promodi_(==por amor de) tomam em Macau, como em Santo Antão, o logar da conjuncção porque, de um modo independente; em quanto o _passóba_ (==_por es'obra_) de Curaçáo nos lembra o _quamobrem_ latino. _Assilai_ por _tal_ em Ceylão e Macau deve ter-se produzido tambem independentemente n'um e n'outro dialecto; a palavra é composta de _assi_ (d'este modo) e _lai_ por _laia_, que em portuguez significa especie, sorte, estofo. sentido desenvolvido do de _lã_. A extensão já tão consideravel d'este artigo não nos permitte desenvolvermos mais completamente estas idéas, julgâmos porém ter ministrado sufficientes provas de que os dialectos creolos e formações similhantes não revelam influencia alguma directa, salvo no vocabulario, das linguas anteriores dos povos que os fallam, mas que se deve ver n'elles apenas o resultado da acção de leis geraes a que obedece por toda a parte o espirito humano. O nosso _Estudo sobre a grammatica e o vocabulario do indo-portuguez_ completará as nossas observações na parte comparativa[15]. Notas: [1] Logo qui por _quê l'or qui_. Hoje é muito usado na cidade da Praia. [2] O desapparecimento da syllaba inicial de _minha_ explica-se pelo facto d'esta palavra se tornar proclitica? G. Vicente tem _enha_. [3] As particularidades historicas que seguem são extrahidas da obra _Ceylon, an account of the Island_, etc. by sir James Emerson Tennent. London, 1860, 2 volumes, 8.^o [4] Istes Escrituras de Novo Testamento, (que nossa Senhor Jesus Christo ja papia,) _particularmente_ te da sabe, istes Mandamentos, que quer dizia. [5] _Apud_ Carl Engel, _An Introduction to the Study of National Music._ London, 1866. 8.^o, p. 351. [6] Catin en patois normand est une poupée. [7] _Annaes da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro._ 1878-1879. Vol. IV. _Manuscripto guarani da Bibliotheca Nacional do Rio de Janeiro_, etc., _publicado com a traducção portugueza, notas, e um esboço grammatical do abáñee_ pelo dr. Baptista Caetano d'Almeida Nogueira, p. XI-XII. [8] _O Selvagem_, I. Curso da lingua geral segundo Ollendorf. II. Origens, costumes, região selvagem, por Couto de Magalhães. Rio de Janeiro, 1876, 8.^o, p. 40. [9] Ob. cit., p. 77. [10] _O Selvagem_, I. Curso da lingua geral segundo Ollendorf, etc., p. 77. [11] «Dès 1633, le père Lejeune se plaignait qu'on employât entre Français et Indiens un jargon qui n'était, à proprement parler, ni le français ni l'indien, et cependant, ajoutait-il avec surprise, les Français, à l'user, se flattent de parler indien, et les Indiens pensent s'exprimer en bon français.» Maspèro _Rev. ling._ IX, 405. [12] Vid. acima as interessantes observações de Bocandé. [13] Seria preferivel dizer: parte dos que ellas ignoravam. [14] Vid. J. Storm, _Englische Philologie_, I, 207 ss. [15] N'esse estudo tentaremos tanto quanto nos é possivel fazer com os materiaes que temos á nossa disposição, indicar as particularidades phoneticas do indo-portuguez, escondidas em grande parte sob a orthographia adoptada pelos missionarios inglezes, e que julgâmos não dever modificar no specimen que démos, reproduzido do folheto que contém _Orações_, _Dez Mandamentos_, _O sermão riba do montanha_ (sem data nem logar de impressão). Lista de erros corrigidos Aqui encontram-se listados todos os erros encontrados e corrigidos: +----------+-------------------------+----------------------+ | | Original | Correcção | +----------+-------------------------+----------------------+ |#pág. 4| Anãto | Antão | |#pág. 13| Estes cavallos são teus.| Esta egua é tua. | |#pág. 30| _three voyage_ | _three voyages_ | +----------+-------------------------+----------------------+ As variações de dialecto (por vezes escrito dialeto) foram mantidas de acordo com o original. As variações de nomes próprios foram mantidas de acordo com o original (ex: Newtead e Newstead ) *** END OF THE PROJECT GUTENBERG EBOOK OS DIALECTOS ROMANICOS OU NEO-LATINOS NA ÁFRICA, ÁSIA E AMÉRICA *** Updated editions will replace the previous one—the old editions will be renamed. 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It exists because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from people in all walks of life. Volunteers and financial support to provide volunteers with the assistance they need are critical to reaching Project Gutenberg™’s goals and ensuring that the Project Gutenberg™ collection will remain freely available for generations to come. In 2001, the Project Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure and permanent future for Project Gutenberg™ and future generations. To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 and the Foundation information page at www.gutenberg.org. Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non-profit 501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal Revenue Service. The Foundation’s EIN or federal tax identification number is 64-6221541. Contributions to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent permitted by U.S. federal laws and your state’s laws. The Foundation’s business office is located at 809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887. Email contact links and up to date contact information can be found at the Foundation’s website and official page at www.gutenberg.org/contact Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation Project Gutenberg™ depends upon and cannot survive without widespread public support and donations to carry out its mission of increasing the number of public domain and licensed works that can be freely distributed in machine-readable form accessible by the widest array of equipment including outdated equipment. Many small donations ($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt status with the IRS. The Foundation is committed to complying with the laws regulating charities and charitable donations in all 50 states of the United States. Compliance requirements are not uniform and it takes a considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up with these requirements. We do not solicit donations in locations where we have not received written confirmation of compliance. To SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any particular state visit www.gutenberg.org/donate. While we cannot and do not solicit contributions from states where we have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition against accepting unsolicited donations from donors in such states who approach us with offers to donate. 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